PADRE FLÁVIO CAVALCA DE CASTRO
Anaiara Camila de Jesus. Onde será que nosso povo encontra tanta imaginação para nomes, nomes que às vezes soam como versos? Anaiara Camila de Jesus. Uma criança de sete meses. E seu belo nome já estava no jornal, envolto numa história estranha e triste. Criança roubada, trazida de longe. Criança roubada por outra criança, já esfacelada nas engrenagens sem alma da vida. Ninguém sabe por quê. Nem a seqüestradora grávida, doente, sozinha.
Anaiara estava aos cuidados da Justiça, enquanto a polícia procurava localizar sua mãe. Encontrou-a finalmente num barraco à beira da rodovia. Terminara o drama, podia-se esperar, da mãe e da criança. No barraco, a mãe de vinte e dois anos, casada desde os doze, recebeu a notícia do encontro da filha. Não sei qual sua reação. Os jornais disseram apenas que ela não queria de volta a filha. Não a queria de volta, porque não tinha como a criar, samaritana à beira da estrada, abandonada pelo último dos muitos homens de sua curta vida.
Anaiara Camila de Jesus, que será de você? Só espero que não condene sua mãe que não a quis. Que pelo menos não a condene como a maior culpada. Você ainda não compreende este nosso mundo. Falamos muito das crianças, temos até uma semana da criança, mas ainda não temos solução para casos como o seu e o de sua mãe lá no barraco à beira da rodovia. E, para dizer a verdade, parece que temos coisas mais importantes a resolver, como a liberação sexual, a liberdade para a pornografia, a derrubada de tabus. É, a derrubada de normas que deveriam evitar a repetição de casos como o seu, Anaiara.
Não, não condene sua pobre mãe antes de conhecer melhor este nosso mundo. Pelo menos ela deixou que você nascesse. Outras não chegam a tanto. Se você não puder mesmo deixar de condenar, condene a todos nós, responsáveis por este mundo para onde você chegou há tão pouco tempo. Todos somos responsáveis, uns mais outros menos, ainda que geralmente o procuremos negar. Anaiara Camila, que será de você? Ou melhor: deixaremos que você seja alguém? De uma coisa você pode estar certa: neste ano ainda teremos a semana da criança. E no outro também, e logo teremos preparada para você uma instituição qualquer de recuperação. A menos que haja coisa mais importante a fazer. Ou que um milagre aconteça.
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