Desejo propor-vos algumas iniciativas concretas para enfrentar a situação. No final do meu encontro com os Bispos da Irlanda, pedi que a Quaresma deste ano fosse considerada como tempo de oração para uma efusão da misericórdia de Deus e dos dons de santidade e de força do Espírito Santo sobre a Igreja no vosso país. Agora convido todos vós a dedicar as vossas penitências da sexta-feira, durante todo o ano, de agora até à Páscoa de 2011, por esta finalidade. Peço-vos que ofereçais o vosso jejum, a vossa oração, a vossa leitura da Sagrada Escritura e as vossas obras de misericórdia para obter a graça da cura e da renovação para a Igreja na Irlanda. Encorajo-vos a redescobrir o sacramento da Reconciliação e a valer-vos com mais frequência da força transformadora da sua graça.
Deve ser dedicada também particular atenção à adoração eucarística, e em cada diocese deverão haver igrejas ou capelas reservadas especificamente para esta finalidade. Peço que as paróquias, os seminários, as casas religiosas e os mosteiros organizem tempos para a adoração eucarística, de modo que todos tenham a possibilidade de participar deles. Com oração fervorosa diante da presença real do Senhor, podeis fazer a reparação pelos pecados de abuso que causaram tantos danos, e ao mesmo tempo implorar a graça de uma renovada força e de um sentido da missão mais profundo por parte de todos os bispos, sacerdotes, religiosos e fiéis.
Tenho esperança em que este programa levará a um renascimento da Igreja na Irlanda na plenitude da própria verdade de Deus, porque é a verdade que nos torna livres (cf. Jo 8, 32).
Além disso, depois de me ter consultado e rezado sobre a questão, tenciono anunciar uma Visita Apostólica a algumas dioceses da Irlanda, assim como a seminários e congregações religiosas. A Visita propõe-se ajudar a Igreja local no seu caminho de renovação e será estabelecida em cooperação com as repartições competentes da Cúria Romana e com a Conferência Episcopal Irlandesa. Os pormenores serão anunciados no devido momento.
Além disso proponho que se realize uma Missão a nível nacional para todos os bispos, sacerdotes e religiosos. Alimento a esperança de que, haurindo da competência de peritos pregadores e organizadores de retiros quer da Irlanda como de outras partes, e reexaminando os documentos conciliares, os ritos litúrgicos da ordenação e da profissão e os recentes ensinamentos pontifícios, alcanceis um apreço mais profundo das vossas respectivas vocações, de modo a redescobrir as raízes da vossa fé em Jesus Cristo e a beber abundantemente nas fontes da água viva que ele vos oferece através da sua Igreja.
Neste Ano dedicado aos Sacerdotes, recomendo-vos de modo muito particular a figura de São João Maria Vianney, que teve uma compreensão tão rica do mistério do sacerdócio. «O sacerdote, escreveu, possui a chave dos tesouros do céu: é ele quem abre a porta, é ele o dispensador do bom Deus, o administrador dos seus bens». O cura d’Ars compreendeu bem como é grandemente abençoada uma comunidade quando é servida por um sacerdote bom e santo. «Um bom pastor, um pastor segundo o coração de Deus, é o tesouro maior que o bom Deus pode dar a uma paróquia e um dos dons mais preciosos da misericórdia divina». Por intercessão de São João Maria Vianney possa o sacerdócio na Irlanda retomar vida e a inteira Igreja na Irlanda crescer na estima do grande dom do ministério sacerdotal.
Aproveito esta ocasião para agradecer desde já a quantos se comprometerem no empenho de organizar a Visita Apostólica e a Missão, assim como os tantos homens e mulheres que em toda a Irlanda já se comprometeram pela tutela dos jovens nos ambientes eclesiásticos. Desde quando a gravidade e a extensão do problema dos abusos sexuais dos jovens em instituições católicas começou a ser plenamente compreendido, a Igreja desempenhou uma grande quantidade de trabalho em muitas partes do mundo, a fim de o enfrentar e remediar. Enquanto não se deve poupar esforço algum para melhorar e actualizar procedimentos já existentes, encoraja-me o facto de que as práticas de tutela em vigor, adoptadas pelas Igrejas locais, são consideradas, nalgumas partes do mundo, um modelo que deve ser seguido por outras instituições.
Desejo concluir esta Carta com uma especial Oração pela Igreja na Irlanda, que vos envio com o cuidado que um pai tem pelos seus filhos e com o afecto de um cristão como vós, escandalizado e ferido por quanto aconteceu na nossa amada Igreja. Ao utilizardes esta oração nas vossas famílias, paróquias e comunidades, que a Bem-Aventurada Virgem Maria vos proteja e vos guie pelo caminho que conduz a uma união mais estreita com o seu Filho, crucificado e ressuscitado. Com grande afecto e firme confiança nas promessas de Deus, concedo de coração a todos vós a minha Bênção Apostólica em penhor de força e paz no Senhor.
Vaticano, 19 de Março de 2010, Solenidade de São José
Benedictus PP. XVI
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