PADRE LUIZ CARLOS DE OLIVEIRA CSsR
Onde está teu irmão?
A Bíblia não somente conta fatos históricos, mas é uma leitura da realidade humana em relação a Deus. Por essas narrações, compreendemos quem somos nós e qual o caminho que Deus nos oferece. Vejamos a história de Caim e Abel: Eles continuam dentro de nós e em nossos relacionamentos. Caim e Abel somos nós. Deus, depois do assassinato, perguntou a Caim: “Onde está Abel, teu irmão?” (Gn 4,9). Essa pergunta percorre a história da humanidade. Por um lado é Deus que defende cada homem. Por outro lado somos nós que temos a ver com o outro. “Acaso sou o guarda de meu irmão?” pergunta Caim. Além da responsabilidade que temos sobre cada pessoa, cada uma é parte de nossa experiência de Deus. Não se conhece a Deus se não se conhece o irmão. João escreve: “Quem não ama seu irmão a quem vê, a Deus que não vê não poderá amar” (1Jo 4,20). A experiência do irmão é necessária para o conhecimento de Deus e par o encontro com Ele. Jesus pensava assim, pois a carta aos Hebreus diz: “Ele não se envergonha de chamá-los irmãos” (Hb 2,11). Demonstra esta experiência em sua própria encarnação, pois sua divindade se aniquila e se esconde sob os véus de nossa carne. Fez-se próximo de cada pessoa, como na parábola do samaritano. Descendo de seu jumento, abaixou-se para socorrer o ferido. O homem ferido pelo pecado é o alvo do Filho de Deus. Busca a ovelha perdida. Ele sabia onde estava seu irmão. Caim, o primogênito da humanidade contrasta com o primogênito da nova humanidade. E nos, se quisermos conhecer a Deus, temos de fazer a experiência de ser irmão e de ter irmãos. O mandamento do amor se resume em que “quem ama a Deus, ame também seu irmão” (1Jo 4,21).
Ver Deus no irmão
As buscas de misticismo, mesmo no âmbito católico e evangélico, têm uma tendência a sair da realidade e viver de fenômenos. Deus, contudo, está mais perto e mesmo onde tememos que não esteja. Um fato contado por Anselm Grünn narra que em um campo de concentração estavam enforcando o menino diante de todos. O pobrezinho se debatia, demorando a morrer. Um prisioneiro disse: “Onde está Deus?” Outro responde: “Está lá, sendo enforcado”. A experiência de Deus, de Sua Palavra e de seu amor acontece quando O vemos no outro. Parece tão distante. No outro, quem? Cada pessoa é um traço de Deus. Deus está ali todo inteiro, como a chamar-nos para amá-lO, percebê-lO e senti-lO. Se não sou capaz de vê-lO no irmão, que certeza temos de tê-lO encontrado?
Ver o irmão em Deus
O superior dos trapistas degolados na Argélia, há uns poucos anos, já sabendo que estavam em riscos, escreve em seu testamento que queria ver seu assassino como Deus o via. Mais que ser responsável, temos de ver o irmão como Deus vê. A contemplação será autêntica quando, contemplamos o outro com os olhos de Deus. Ver com os olhos de Deus é enxergar no outro alguém a ser amado. Nesse alguém o Pai vê o Filho amado. O documento de Puebla recomenda que vejamos os muitos rostos de Cristo. Jesus se identifica com cada homem. “Tive fome e me destes de comer, tive sede e me destes de beber... Todas as vezes que fizestes isso a um destes pequeninos, por seu meu discípulo, foi a mim que o fizestes” (Mt 25,40).
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