Encontro de Frei Betto com o Papa: “foi rápido, mas consistente, eu disse tudo o que precisava”
Natasha Pitts
Adital

Em
janeiro deste ano, o frei dominicano enviou uma carta ao Papa dizendo que
estaria em Roma de 07 a 14 de abril. Com a ajuda do jornalista italiano Antonio
Vermigli e de um vaticanista, a carta chegou às mãos de um assessor direto do
Papa, que marcou para que Frei Betto comparecesse à audiência da quarta-feira,
pois o Francisco o conhecia e queria falar com ele.
"Quando
o Papa passou junto ao lugar em que eu me encontrava eu disse: Santo Padre, eu
quero agradecer a carta que o senhor enviou às Comunidades Eclesiais de Base no
encontro em Juazeiro (Juazeiro do Norte, no Estado do Ceará), em janeiro, mas
eu gostaria que o senhor sempre lembrasse que as Comunidades não são um
movimento da Igreja, são a própria Igreja no meio dos pobres. Gostaria que o
senhor também sempre dialogasse, como pai amoroso, com a Teologia da Libertação,
que é uma filha fiel à Igreja e que sempre se lembre dos povos indígenas. O
encontro foi rápido, mas foi consistente, eu disse tudo o que precisava”,
relatou Frei Betto.
O
religioso também pediu a reabilitação do Mestre Eckhart e de Giordano Bruno,
dois dominicanos da Idade Média condenados pela igreja. "Ele, sempre prestando
muita atenção ao que eu dizia falou: reze por isso. Terminei dizendo em latim: Fora
dos pobres não há salvação. E ele falou: estou de acordo”.
Frei
Betto explicou o pedido de reabilitação dos dois dominicanos. "Mestre Eckhart foi
um grande místico alemão centrado na subjetividade humana e com expressões que
chocaram os ouvidos de Roma na época; tipo: ‘Eu e Deus somos um’. Ora, São
Paulo, muito antes de ser considerado santo, falou isso, ‘já não sou eu quem
vivo, é Cristo que vive em mim’. A igreja estava entrando no período
inquisitorial e qualquer coisa que soasse estranho era motivo de censura ou de
condenação. Giordano Bruno foi um homem profético, intuitivo, também um grande
místico, foi queimado vivo, pois ele ridicularizou muito os inquisidores, a
ponto de dizer aos seus algozes: vocês têm mais medo de mim do que eu de vocês.
E isso irrita até hoje as pessoas conservadoras da Igreja, embora cada cidade
na Itália, por menor que seja, tenha uma rua Giordano Bruno”.
Sobre
esse pedido especial, realizado porque a ordem dominicana completa 800 anos em
2016, Frei Betto interpretou que as palavras do Papa: "Reze por isso”, soaram
como quem diz: eu estou de acordo, mas não vai ser fácil.
Questionado
sobre quais assuntos abordaria com o Papa caso tivesse mais tempo, Frei Betto
afirmou que "falaria da mudança do Estatuto da Mulher na Igreja, pois a mulher
até hoje é considerada um ser inferior, por isso não pode ser sacerdote;
falaria de Cuba, pediria para ele interferir pela libertação dos cinco cubanos,
e falaria da importância dele valorizar os movimentos sociais”.
A
rápida troca de palavras entre os religiosos incomodou a imprensa conservadora
e provocou a publicação de matérias controversas e com informações erradas. O
jornal La República noticiou "Papa recebe teólogo rebelde” e chegou a afirmar
que Betto havia sido recebido na Casa Santa Marta, a residência do Papa. A
informação foi desmentida pelo L’Osservatore Romano, o jornal oficial do
Vaticano
"Esse
encontro incomodou bastante a imprensa conservadora, que, por sinal, já estava
bastante incomodada porque o Papa recebeu Gustavo Gutiérrez, considerado o pai
da Teologia da Libertação”, explicou Frei Betto.
Fonte: Adital 06/05/14
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