Entrevista com Hans Küng
Andrea Tarquini
La Repubblica
10-02-2014
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Hans Küng - teólogo - em seu escritório |
"Agora, o Papa Francisco pode apelar à resposta da maioria dos fiéis sobre questões tão importantes no debate com os reacionários da Cúria. O Papa Emérito Bento XVI escreveu há pouco para mim, eterno rebelde, uma carta afetuosa em que se compromete a apoiar Francisco, esperando em cada sucesso seu." Em suma, substancialmente, é quase como dizer que Francisco é como Gorbachev, o homem novo contra os ortodoxos, mas com as pessoas ao seu lado. Eis a voz de Hans Küng, máximo teólogo católico crítico vivo, sobre a pesquisa chocante publicada nesse domingo no jornal La Repubblica [veja abaixo, após esta entrevista] e sobre o seu efeito na Igreja.Eis a entrevista. Professor Küng, como você avalia a sondagem sobre os cristãos no mundo?Hans Küng - Tomados conjuntamente e analisados, esses dados revelam a extraordinária discrepância entre os ensinamentos da Igreja sobre questões fundamentais, como a família, e, ao contrário, a visão real dos católicos no mundo.Para você, entre os muitos resultados da sondagem, quais são os mais importantes?Hans Küng - Para mim, o mais importante é a imensa maioria de consensos para o Papa Francisco: 87% dos católicos entrevistados em todo o mundo e 99% dos italianos estão de acordo com ele. É uma enorme manifestação de confiança para o Sumo Pontífice. Para mim, é um pequeno milagre, depois dos anos da crise de confiança que tinha investido contra a Igreja nos anos do Papa Bento XVI. Agora, em menos de um ano, o Papa Francisco conseguiu inverter a tendência dos sentimentos dos fiéis de todo o mundo.E o Papa Emérito Bento XVI, a seu ver, ficará feliz ou triste com a resposta da sondagem?Hans Küng - Naturalmente, ver esses resultados irá lhe entristecer, especialmente repensando hoje nos últimos meses vividos por ele como pontífice, no seu mandato. Mas, seguramente, ele irá se alegrar com o fato de que agora se segue em frente, e ele, a meu ver, pensa mais no destino da Igreja do que naquilo que diz respeito a ele mesmo.É só uma suposição sua ou você pode provar sobre o que você diz sobre os sentimentos de Joseph Ratzinger neste momento?Hans Küng - Eu acredito que explicarei melhor o pensamento de Bento XVI citando frases da sua recentíssima carta para mim.Bento XVI lhe escreveu depois de anos de conflitos? E o que lhe escreveu?Hans Küng - Bem, espere só um momento, deixe-me pegar aqui na minha escrivaninha lotada esse manuscrito com a carta da Santa Sé endereçada por ele, pessoalmente, da sua residência de papa emérito. Data: 24 de janeiro de 2014. Remetente: "Pontifex emeritus Benedictus XVI". "Sou grato por poder estar ligado por uma grande identidade de pontos de vista e por uma amizade de coração ao Papa Francisco. Hoje, vejo como minha única e última tarefa é apoiar o seu Pontificado na oração." Acredito que são palavras muito belas. Certamente, escritas antes da publicação da sondagem. Essa escolha de inclinação do Papa Emérito Bento XVI me convence ainda mais.E o que significa a sondagem para os bispos e, em geral, para a hierarquia eclesiástica?Hans Küng - Eu gostaria de distinguir três categorias de prelados. Para os bispos prontos para as reformas, e eles existem em todo o mundo, os resultados da sondagem significam um grande encorajamento: eles deverão se comprometer abertamente com as suas convicções e não ficar tímidos demais. Segundo, para os conservadores que têm as suas reservas: eles deveriam refletir sobre as suas reservas e deveriam ouvir os argumentos dos reformadores. Terceiro, para os bispos reacionários, presentes não só no Vaticano, mas em todo o mundo, eles deveriam abandonar a sua resistência obstinada e escolher a razoabilidade.E o que significa a sondagem para a base, para os cristãos? Encorajamento à reforma a partir de dentro, como Gorbachev sonhou em vão para o socialismo real e o Império Soviético?Hans Küng - É importante o sinal de que o movimento para a reforma dentro da Igreja tem do seu lado a grande maioria dos fiéis. O movimento de reforma é apoiado pela base – movimentos de reforma, como o Nós Somos Igreja – mais do que apareceu até agora, mais do que dentro da Igreja oficial. É um fato em nível internacional.Professor, há décadas, você pede mudanças e aberturas na Igreja. Foi o primeiro e pagou as consequências por isso. Para você, essa sondagem é uma vitória, uma vitória amarga, ou outra coisa?Hans Küng - Eu não me considero um vencedor, não liderei uma batalha por mim, mas sim pela Igreja. Evidentemente, eu tive muitas experiências amargas, mas é bom ver uma mudança na direção do Concílio Vaticano II. Eu tive a grande alegria de poder ver, ainda vivo, o sucesso das ideias de reforma da Igreja para a qual eu combati por tanto tempo, de poder ver o início da virada. Para mim, é um novo impulso vital, como diz Bento XVI, para este último trecho do percurso da vida que nós agora temos pela frente.Que consequências o Papa Francisco deveria tirar dos resultados dessa sondagem?Hans Küng - Se eu pudesse lhe dar um humilde conselho, ele deveria seguir em frente com coragem no caminho em que está encaminhado e não ter medo das consequências.Concretamente, o que isso significa?Hans Küng - Espero que ele use a arte da Distinção que ambos aprendemos na Pontifícia Universidade Gregoriana:
- onde há, segundo a sondagem, consenso na Comunidade eclesial, ele deveria propor uma solução positiva para o Sínodo.
- Onde há desacordo, ele deveria permitir e suscitar um livre debate na Igreja.
- Onde ele mesmo é de outra opinião com relação à maioria dos católicos, como sobre o sacerdócio para as mulheres, ele deveria nomear uma força-tarefa de teólogos e de outros cientistas, de homens e mulheres, para abordar o tema.
Tradução de Moisés Sbardelotto.Fonte: Instituto Humanitas Unisinos - Notícias - Terça-feira, 11 de fevereiro de 2014
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