25ª Ficha: Decreto Unitatis Redintegratio (UR)
DECRETO “UNITATIS REDINTEGRATIO” (UR)
SOBRE O ECUMENISMO*
Em 1960, o Papa João XXIII criou o
Secretariado para a Promoção da Unidade dos Cristãos, abrindo caminhos
para uma posição eclesial mais clara em favor desta causa.
Posteriormente, o Concílio Vaticano II teve como uma de suas principais
preocupações a promoção da unidade das Igrejas e Comunidades Eclesiais
cristãs separadas da Sede Apostólica de Roma. Em 21 de novembro de 1964,
o Papa Paulo VI promulgou o Decreto Conciliar Unitatis Redintegratio (Reintegração
da Unidade – UR) sobre o Ecumenismo, uma orientação pastoral de como a
Igreja deseja que os cristãos católicos vivam e anunciem a mensagem
cristã, trabalhando pela unidade, como sinal de fidelidade a Jesus
Cristo. Uma das principais finalidades deste Concílio é alcançar
novamente a unidade de todas as Igrejas e Comunidades Eclesiais a fim de
constituir na terra um só Corpo de Cristo, ao qual é necessário que se
incorporem plenamente todo o Povo de Deus.
No Proêmio do documento, lemos que ‘o
Cristo Senhor fundou uma só e única Igreja’, porém, são inúmeras as
Igrejas Cristãs com diferentes modos de interpretar a doutrina, com
pareceres diferentes, como se o próprio Cristo estivesse dividido. Nos
primeiros séculos, ideias divergentes agitaram o Cristianismo, porém, as
primeiras divisões se formalizaram no segundo milênio da nossa
história. No século XI (1054), em razão de problemas políticos,
culturais e doutrinários ocorreu o primeiro cisma que quebrou a unidade
da Igreja, dividindo-a em Igreja Ocidental (Católica Romana) e Igreja
Oriental (Ortodoxa Grega). Posteriormente, o movimento iniciado por
Lutero, denominado Reforma Protestante, em 1517, fez surgir novas
Igrejas que ficaram conhecidas como Igrejas Protestantes ou Reformadas,
sendo elas: Luterana, Calvinista e Anglicana, e mais tarde, nos EUA,
surgiram novas Igrejas Reformadas: Presbiteriana, Metodista, Batista
etc. A principal característica delas é a existência de uma “Confissão”
própria, com os princípios de fé e doutrinais próprios, tal qual é o
“Credo” para os católicos. Esta divisão, sem dúvida, contradiz
abertamente a vontade de Cristo, escandaliza o mundo, além de prejudicar
a pregação do Evangelho.
Inúmeros esforços têm sido feitos no
sentido de romper esses distanciamentos, buscando restabelecer as
relações e construir alternativas para que todos estejam juntos e unidos
na mesma oikoumene [1], a casa comum da humanidade, onde todas
as pessoas têm o direito de viver e conviver pacificamente, segundo o
desejo expresso por Jesus Cristo na sua prece ao Pai, apresentando o
coração da proposta ecumênica: “[...] que todos sejam um, como tu,
Pai, estás em mim e eu em ti; que sejam um em nós, a fim de que o mundo
creia que tu me enviaste” (Jo 17,21). Participam do ecumenismo
aqueles que invocam o Deus Trino, e confessam a Jesus como Senhor e
Salvador, não só individualmente, mas também reunidos em assembleia, “pois onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estou eu no meio deles” (Mt 18,20).
Ao abordar a prática do ecumenismo, o
Concílio recomenda aos fiéis católicos que eliminem palavras, juízos e
ações que dificultam o relacionamento; que promovam o diálogo e a oração
entre os irmãos das várias Igrejas, em vista do bem comum, dando os
primeiros passos na aproximação, sob a orientação das autoridades
competentes; e que reconheçam e estimem os bens verdadeiramente
cristãos, vindos de um patrimônio comum. O documento lembra também que,
nessas Igrejas, há mártires da fé, gente de testemunho admirável, cujo
exemplo contribui para a nossa edificação.
Embora as Igrejas e Comunidades
eclesiais que se separaram da Sede Apostólica de Roma desde a Reforma
continuem ligadas à Igreja Católica pelos laços culturais, vivenciados
ao longo dos séculos anteriores à separação, existemalgumas divergências
que ainda persistem, por exemplo, sobre Cristo, Palavra de Deus
encarnada; sobre a obra da redenção; sobre o mistério e o ministério da
Igreja; e sobre o papel de Maria na obra da Salvação. Entretanto, o
Batismo, único sacramento comum das Igrejas cristãs, e a Sagrada
Escritura, enquanto Livro comum do Cristianismo, são instrumentos de
diálogo para alcançar a unidade entre os cristãos que estão ligados à
Palavra de Cristo como fonte da força cristã e obedecem ao preceito do
apóstolo: “Tudo o que podeis dizer ou fazer, fazei-o em nome do Senhor
Jesus, dando graças, por ele, a Deus Pai” (Cl 3,17).
Nos últimos 50 anos, o ecumenismo ganhou
amplitude, e abaixo estão relacionados alguns dos mais representativos
organismos ecumênicos:
- O Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos (PCPUC-1989), tem como objetivo por em prática a UR, atua em cooperação e como membro pleno da Comissão Fé e Ordem do Conselho Mundial de Igrejas – CMI [2] (1948) e participa ativamente das muitas atividades para a Promoção da Unidade dos Cristãos, que todos os anos celebra a Semana de Oração de Unidade dos Cristãos (em Janeiro no hemisfério Norte e em torno de Pentecostes no hemisfério Sul), evento que reúne congregações e paróquias de todo o mundo.
- O Conselho Latino Americano de Igrejas - CLAI (1982), com a finalidade de promover a unidade entre o povo cristão do continente, preserva as identidades de cada tradição.
- E o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs – CONIC [3] (1982), organismo ecumênico brasileiro, está aberto ao diálogo e à colaboração com as outras organizações eclesiais, de modo não teórico, mas na prática, sem a intenção de substituí-las ou competir com seus programas.
Em nosso continente, os bispos reunidos
em Medellín (1968), Puebla (1979) e Santo Domingo (1992) aplicaram à
Igreja Católica o espírito do Concílio e recomendaram que o ecumenismo
fosse uma realidade na catequese, no convívio das famílias, no diálogo
desarmado, na colaboração com a promoção dos direitos humanos, na
liturgia com celebrações ecumênicas da Palavra, e que os agentes de
pastoral e o clero tivessem formação ecumênica.
No Brasil, a prática do ecumenismo é um
grande desafio. No século XIX, as Igrejas Protestantes de missão,
oriundas das Igrejas Reformadas americanas (Igrejas Evangélicas),
ingressaram com a finalidade de estender o protestantismo; e no século
XX, as Igrejas Pentecostais, e mais recentemente as Neopentecostais,
chegaram assumindo um caráter fortemente proselitista, pregando contra o
catolicismo, com a finalidade de converter a população católica. Disto
resulta que, por um lado, a Igreja procura estabelecer relações de
proximidade e diálogo com as Igrejas protestantes históricas e, por
outro, tem dificuldades para relacionar-se com algumas Igrejas
Pentecostais e Neopentecostais que se negam a participar do movimento
ecumênico, justamente por não aceitarem dialogar com ela. Apesar de
todas estas dificuldades, nos anos de 2000, 2005 e 2010, a Campanha da
Fraternidade, promovida pela Igreja Católica, foi assumida como Campanha
Ecumênica com o envolvimento da reflexão e mobilização conjunta de
muitas Igrejas Cristãs que lutam juntas na defesa de direitos e
necessidades de todos, especialmente dos mais desprotegidos.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) tem promovido o ecumenismo através da Comissão Pastoral para o Ecumenismo e o Diálogo Inter-religioso.
O texto do Decreto UR termina
declarando confiança no diálogo ecumênico e na unidade dos cristãos, e
mostra que a reconciliação das Igrejas é tarefa que ultrapassa as
possibilidades humanas, pois só é possível com a força da Trindade. O
ecumenismo é mesmo o sopro do Espírito de Deus que nos ensina que é
possível sermos um, mesmo sendo diferentes, porque, embora sejam
significativas, as diferenças que nos separam não podem superar o amor
do Pai que nos une.
A cooperação de todos os cristãos
exprime os laços que os unem entre si e faz resplandecer mais plenamente
a face de Cristo Servo. Ela deve ser aperfeiçoada sempre mais, na
medida em que contribui para promover a dignidade da pessoa humana e a
paz, a superação da fome, o analfabetismo, a pobreza, a falta de
habitações e a distribuição de bens. Cabe aos cristãos reconhecer estes
sinais e participar do trabalho ecumênico: “Ser uma Igreja ecumênica
para transformar este mundo em um mundo de Deus”. Só assim se
compreenderá que os cristãos têm a mesma missão e que estão na barca de
Jesus, na qual todos são chamados a construir uma oikoumene com
justiça e paz: entre os povos, com a terra, do ser humano consigo mesmo
e com a fonte originária da vida, que é Deus, de onde tudo veio e para
onde tudo vai…
Notas
* Esta ficha está sendo publicada anteriormente à Ficha sobre a Declaração Nostra Aetate.
[1] Oikoumene, ecumene, ecumenismo, do
grego oikos, que significa casa, povo, habitação, relação, amizade,
coabitação, familiaridade, terra habitada, mundo conhecido,
reconhecimento, hospitalidade entre outros. Trata-se de um conceito
relacional e dinâmico, que envolve uma responsabilidade comum entre os
cristãos, e que abraça toda a comunidade humana = ‘transformar a
oikoumene a terra habitada’, na família vivente (oikos) de Deus.
[2] CMI criado em 1948, com sede em
Genebra, é uma comunidade de 347 igrejas cristãs de mais de 120 países
de todos os continentes e tem como finalidade facilitar a ação comum das
igrejas, desenvolver consciência ecumênica, organizar conferências,
estabelecer relações com organismos e movimentos ecumênicos pelo mundo.
[3] São membros do Conic: Coordenadoria Ecumênica de serviço (Cese), Koinonia Presença Ecumênica e Serviço,
Centro Ecumênico de Serviço à Evangelização e Educação Popular, Centro
de Estudos Bíblicos (Cebi), Comissão Nacional de Combate ao Racismo
(Cenacora), Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura (Acat-Brasil),
Dia Mundial de Oração (DMO). São sete Igrejas no CONIC: Igreja Católica
Apostólica Romana, Igreja Católica Ortodoxa Siriana, Igreja Evangélica
de Confissão Luterana no Brasil, Igreja Metodista, Igreja Presbiteriana
Unida, Igreja Episcopal Anglicana e Igreja Cristã Reformada.
PARA REFLETIR:
1) Quais os aspectos mais importantes do Ecumenismo?
2) O que tem sido feito em nossas
Comunidades para colocar o decreto UR em prática? Temos desenvolvido uma
espiritualidade ecumênica?
3) O que foi importante para você nesta Ficha, no que diz respeito à sua prática ecumênica?

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