Ficha 1 – História: O que é um Concílio?

A palavra “Concílio” significa
assembleia reunida por convocação e, na Igreja, um concílio sempre teve
como objetivo discutir, definir e deliberar sobre questões de doutrina,
fé, pastorais e costumes. Antes do século XIX, os concílios eram
convocados pelos imperadores e, somente a partir do Concílio Vaticano I,
eles passam, então, a ser uma reunião dos bispos convocados pelo papa.
O texto de At 15,6-35, que narra o
encontro dos apóstolos reunidos em Jerusalém, onde discutiram a questão
da disciplina a ser aplicada aos judeus-cristãos e aos pagãos
convertidos à fé cristã, pode ter sido a inspiração para a realização
dos concílios. Segundo este texto bíblico, após apresentada a questão,
eles a discutiram e depois rezaram invocando o Espírito Santo que
suscitou o que eles deviam fazer, e todos acataram aquela decisão como
vontade de Deus. Apesar deste encontro ser chamado de “Concílio de
Jerusalém”, ele não pode ser considerado um concílio, pois esta
nomenclatura passou a existir somente depois do Concílio de Nicéia, no
ano 325, o primeiro Concílio da Igreja.
Ao longo do tempo, até os dias de hoje, a
Igreja Católica realizou vinte e um Concílios Ecumênicos (Ecumênico
aqui no sentido de universal ou global, com representantes da Igreja de
distintos lugares, bem como quanto à doutrina e costumes eclesiásticos
aceitos como norma para toda a Igreja Católica).
Uma pergunta que talvez possa intrigar é: Por que aconteceram tantos Concílios?
A Igreja possui duas naturezas: a divina
e a humana. Enquanto instituição terrena, ela é circunstanciada pelo
tempo e pelo espaço, e é conduzida por homens que, embora ajam em nome
de Deus, são humanos que pela unção do Espírito Santo, buscam acertar.
Ao longo da História, para cumprir sua ação evangelizadora, a Igreja
procurou se fazer presente no mundo e, com a sua experiência, contribuir
na construção da sociedade. Isto implicou em constantes adaptações no
seu modo de ser e de agir pastoralmente, o que, consequentemente, exigiu
novas formulações doutrinárias, marcando a sua história e, inclusive, a
história do ocidente. Por outro lado, sob a ótica da fé, a existência
de vinte e um Concílios demonstra a força do Espírito Santo que suscitou
novos modos de interpretar as verdades da Revelação para que a Igreja
de Cristo continuasse presente no mundo.
As decisões de todos os Concílios foram incorporadas na vida da Igreja, e fazem parte do deposito fidei,
ou “depósito da fé”, que é preservado pelo Magistério da Igreja. Os
estudos dos concílios mostram que certas questões que num determinado
tempo provocaram grandes discussões, hoje são pacíficas, como por
exemplo, a questão se Jesus de Nazaré era humano ou divino. É difícil
imaginar como isso inflamou os ânimos dos participantes do primeiro
Concílio de Nicéia! Na fé, a Igreja reunida no primeiro Concílio da
História definiu a consubstancialidade de Jesus, isto é, ela reconheceu,
simultaneamente, a humanidade e a divindade de Jesus Cristo.
Um Concílio não nasce da noite para o
dia. Todos foram convocados depois de um longo período de reflexão e,
até mesmo, de resistência da Igreja às novas interpelações da sociedade.
O Magistério da Igreja, exercido pelos bispos, é responsável pela
conservação da doutrina cristã e, justamente por isso, a convocação de
um Concílio acontece para tentar impedir que as mudanças sociais
modifiquem o modo de pensar e agir dos cristãos.
Os dois últimos Concílios que precederam
o Vaticano II, Concílio de Trento (século XVI) e Vaticano I (século
XIX), demonstraram a reação da Igreja diante dos diversos
questionamentos que a sociedade moderna lhe fazia. O Concílio de Trento
foi mais uma resposta da Igreja às questões de fé, especialmente sobre
os sacramentos e a pastoral; enquanto que o Vaticano I versou sobre a
autoridade da Igreja, posicionando-se contra o liberalismo econômico e
político, os progressos científicos etc. Não obstante a isto, algumas
nações europeias adotaram regimes políticos republicanos e aboliram o
Catolicismo como religião oficial do Estado. No início do século XX,
mais preocupada com seus problemas, a Igreja não foi capaz de perceber
as mudanças sociais causadas pelo capitalismo, que acabaram
desencadeando as duas guerras mundiais nas quais países cristãos se
destruíram mutuamente. Às vésperas do Concílio Vaticano II, muitos
constatavam que a Igreja precisava se renovar, pois o zelo exagerado
pela disciplina eclesiástica, pelas normas canônicas e ritualistas
estava comprometendo sua missão no mundo.
Paradoxalmente, ainda no século XIX,
assistiu-se uma tímida mas significativa abertura, que alimentou as
esperanças de novas perspectivas teológicas e eclesiais, com o papa Leão
XIII (1810-1903), que incentivou a pesquisa e o estudo dos textos
originais da Bíblia – em hebraico, aramaico e grego – e os textos
patrísticos, também chamados textos dos Santos Padres. Com isso, logo no
início da primeira metade do século XX, surgiram vários movimentos que
podem ser vistos como causas remotas ao Concílio Vaticano II. O estudo
da Bíblia deu origem ao Movimento Bíblico, que rompeu
com a rigidez de um único sentido literal dos textos bíblicos, trazendo
avanços na compreensão da inspiração e da interpretação dos textos. O
estudo dos textos patrísticos deu origem ao Movimento Litúrgico
que buscou resgatar a liturgia dos tempos antigos, profundamente
cristológica (Cristo é o centro), e essencialmente mistagógica, isto é,
catequética e espiritual orientada para o mistério de Cristo. Este
resgate denunciava a rigidez e a formalidade da liturgia da época.
Paralelamente a estes dois movimentos, surge o Movimento Teológico, como
tentativa de refletir teologicamente as experiências do homem moderno
diante dos avanços da Ciência, da História, da Literatura e da Filosofia
que sempre foram negados pela Igreja. Este Movimento idealizou uma
teologia que propiciasse uma moderna compreensão global da existência,
da transcendência e do espiritual.
Desde o início do século XX, houve
também grandes esforços dos Movimentos Ecumênicos, principalmente entre
os protestantes que cada vez mais questionavam a Igreja Católica, de tal
forma que, timidamente, dentro da Igreja começam a aparecer
simpatizantes da causa, até que em 1960 foi criado o Secretariado para a
Promoção da Unidade dos Cristãos que, depois do Concílio Vaticano II,
tornou-se Pontifício Conselho para a Promoção da Unidadedos Cristãos.
A partir destes movimentos, o termo “ecumênico” passou a ter o
significado pelo qual o entendemos atualmente: movimento entre diversas
denominações cristãs na busca do diálogo e cooperação comum, buscando
superar as divergências históricas e culturais a partir de uma
reconciliação cristã que aceite a diversidade entre as Igrejas.
Ao se defrontar com o crescente fenômeno
da urbanização e da secularização, a Igreja também sofreu mudanças. Até
então, sua pastoral se orientava, sobretudo, para o meio rural e
agrário e os novos desafios da cidade encontraram um clero despreparado.
Com relação ao mundo operário, a Igreja, por meio do papa Leão XIII, ao
procurar dar respostas às questões sociais, principalmente ao mundo do
trabalho, abriu espaço para o chamado Movimento Social, que recentemente foi identificado como a origem da Doutrina Social da Igreja.
Por fim, a Instituição foi percebendo que nos muitos espaços do mundo
moderno, aos quais a Igreja não tinha acesso, havia leigos cristãos. É
neste contexto, portanto, que surge a Ação Católica como um dos mais
importantes Movimentos Leigos da História da Igreja. Ela tinha como projeto cristianizar a vida pública, através dos leigos orientados pelo clero, e era vista como um exército pacífico a serviço de Cristo Rei, na implantação do seu Reino.
Todos estes Movimentos trouxeram a
questão da modernidade para dentro da Igreja, como desafios que
emergiram para que ela saísse de uma suposta estabilidade conservadora e
abrisse espaços para um diálogo com o mundo moderno. Assim, na segunda
metade do século XX, não restava alternativa às Igrejas cristãs, a não
ser assumir a necessidade de mudanças internas. Estes diversos fatores
influenciaram na convocação e na orientação do Concílio Vaticano II, que
possibilitou uma modernização eficaz da Instituição, com a finalidade
de tornar viva e atual a mensagem de esperança do Evangelho, para
atender melhor as exigências dos novos tempos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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________, ANTONIAZZI A. Cristianismo 2000 Anos de Caminhada. São Paulo: Paulinas, ed. 3ª, 1996.
Referências Eletrônicas.
Perguntas para reflexão:
- O que você não sabia sobre os Concílios e o que mais chamou sua atenção?
- Diante das colocações acima, você acredita ser importante para os leigos, conhecer mais a história da Igreja? Por quê? E, como você entende agora, a atuação e as resistências da Igreja, frente ao mundo?
- Qual a importância do estudo dos Concílios para as pastorais?
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