Uma vez redentorista, sempre
redentorista!
021 – Os “eletrodomésticos”
Na casa de meus pais,
eu menino, não havia eletricidade, nem água canalizada ou tratada, mesmo assim
eles se esforçavam o máximo para nos dar conforto, mas era difícil. Vejam:
Pilão
O pilão servia para pilar o arroz com casca ou o café em coco, além de socar o
milho e o amendoim para as paçocas.
O café, comprado com casca, pilado, era torrado em uma
panela de ferro – papai gostava de novidade e modernidade, então comprou
uma panela parecendo uma bola – a máquina prática de torrar café.
Moinho
O moinho de ferro fundido, manual - chamado de macaquinho,
por sua aparência - era um eletrodoméstico dos mais úteis: moíam-se o
café torrado e o fumo seco para o rapé de papai e, na falta de fubá, o milho
para os pintinhos, o amendoim para a paçoca, e até mesmo arroz quando se queria
um mingau. Quanto mais fino se desejavam o café, o fumo ou o arroz, mais se
apertava um seu parafuso e mais força era necessário para rodar sua manivela.
Ralo
Quando se preparava o mingau de milho verde, ralava-se a
espiga em ralo feito de lata – pegava-se um pedaço de uma lata e furava-a em
linha com um prego, e as bordas do furo no avesso da lata tornavam-se
pontiagudas – a lata virava um bom e duradouro ralo; ralava-se em cima de uma
gamela. O mingau era quase um angu, pois, na ausência de geladeira, ele duro
era mais fácil de se conservar – comíamos em pedaços, inclusive sujavam-se
menos vasilhas – água só do Rio Piracicaba. Como lá em casa havia muito pé de
coco da Bahia, o ralo era de grande utilidade para o preparo das cocadas.
Ralavam-se ainda a mandioca e a araruta para preparar o polvilho; o “ralado”
era peneirado em um pano e o caldo deixado em repouso; tirando-se o
sobrenadado, a água, o decantado era seco ao sol, sendo exatamente o
polvilho desejado.
Além das cocadas, mamãe preparava o doce de leite, e eu
detestava mexê-lo na panela, no fogão a lenha – não conhecia o fogão a gás – se
é que existia; com o calor do fogão, mais o calor de Fabriciano, a gente suava
às bicas! Vendiam-se esses benditos doce de leite e cocadas, aos pedaços, na
loja, ou colocavam-nos num prato e nós meninos saíamos à rua para vendê-los,
gritando: “Olha o doce de leite!”. “Olha a cocada!”.
Panelas
As panelas eram de ferro. As vasilhas, quase todas, eram
latas ou cuias – feitas de um tipo de abóbora – é a casca da abóbora d’água -
seca ela endurece. Raros os utensílios de alumínio.
As gamelas, de madeira, e a colher de pau faziam as vezes
de batedeira de bolo ou quaisquer outras massas.
O “forninho”, como dizíamos, era embutido na parte de trás
do fogão a lenha; de grande utilidade para assar os bolos e biscoitos. O forno,
normalmente construído à parte ou, quase sempre, um pouco afastado da casa,
inclusive com uma pequena cobertura; seria mais para maior produção dos
quitutes.
Cozido,
o feijão era liquidificado com uma ferramenta feita de um pedaço de cabo
de vassoura, com uma cruzeta de três a quatro centímetros de lado, de arco de
barril.
Preparar
o café era no tripé, que poderia ser de ferro ou madeira, era o suporte para o coadô
de pano comum ou, o melhor, de flanela.
A
máquina de moer carne
Na
máquina de moer carne moíam-se amendoim, feijão, batata e, além da carne,
utilizava-a para encher linguiça etc....
A
carne cozida era guardada em latas de 20 litros no meio de gordura de porco – a
geladeira! - conservava-se por uns três a quatro meses, tornando-se, passados
os dias, mais macia. A carne crua, salgada, era colocada no sol por alguns
dias, ou em um varal em cima do fogão a lenha, onde permaneciam
dependuradas por longos dias tomando fumaça – fácil de pegar e colocar na
panela, pois estava ali à mão a carne de sol defumada!
Ovos
batidos em um prato com uma colher – mamãe mandava e eu detestava bater as
claras. U’a mola em aspiral, com um cabo de madeira, agilizava o meu castigo...
infelizmente usei-a poucas vezes...
Havia
também o batedor de bife e o rolo de pastel, muito pouco usados hoje, mas de
grande utilidade na época – rolo de pastel é aquele que as mulheres, altas
madrugadas, atrás da porta e amadas com ele, esperavam os maridos bebuns...
Os
roceiros traziam para papai a cachaça em garrafas, em litros ou latas de
querosene – normalmente vendida em doses ou em garrafa. Para fechar as
garrafas, papai comprava tampinhas novas e para colocá-las nas garrafas havia
uma ferramenta, o tapador de garrafas – a gente falava tampador de garrafa.
As
mercadorias chegavam em caixotes de madeira e não em caixas de papelão. Para
reforçar os caixotes, para não abrirem, usava-se passar em seu redor uma fita
de aço bem esticada – o arco de barril. O bico de papagaio arrebentava, ou cortava
ou até mesmo esticava, se necessário fosse, o arco de barril - uma ferramenta
que havia na loja. Hoje há fita semelhante, mas de plástico.
A roupa, lavada com água do rio ou ribeirão, com sabão em
barra ou pedra, era quarada, isto é, colocada em cima de um gramado, ou mato,
para tomar sol – isso, além do anil, clareava a roupa. Poder-se-ia estendê-la
numa cerca qualquer ou num quarador de tela, como havia lá em casa.
A roupa quarada em gramados ou cercas era ela passada a
ferro a brasa. Não se vestia uma roupa sem passá-la – poder-se-ia pegar cobreiro,
de algum bicho que passasse por lá. O ferro de passar roupa era de ferro
fundido. Abrindo sua tampa, na parte de cima, colocava-se a brasa; nos fundos, a
parte mais larga, um buraco por onde se soprava a brasa e por onde entrava o ar
para mantê-la acesa.
.
Quando acabava a brasa do fogão da casa, buscava-se na casa do vizinho. Daí
adveio a frase dita para quem vai a algum lugar e volta logo:- Foi buscar
fogo? Ou: - Foi buscar brasa? – isso porque quem ia pedir brasa na
casa do visinho deveria voltar rápido, senão a brasa apagaria no caminho.
Tomava-se muito cuidado para não queimar ou sujar as roupas com o carvão, a
brasa ou a cinza.
A
primeira profissão de papai foi a de aprendiz de alfaiate. Por pouco tempo; não
suportava buscar e pedir, a toda hora, brasa na casa dos vizinhos para colocar
no ferro de passar roupa - não existia ainda ferro elétrico.Trabalho muito e
pouco fogo e menos brasa ainda na casa!
As
frutas eram descascadas com faca, espremidas, peneiradas ou raladas à mão – nem
o espremedor de laranja manual existia.
Em
Rio Piracicaba, Vovô Pedro cantava louvações e colocava louros no recém chegado
espremedor manual de laranja: - “Agora, cê pensa bem, a gente pra chupar uma
laranja é só apertar meia laranja nisso aqui. Há dois mil'anos que a gente
tinha que descascar, fazer uma mamurcha, espremer, espremer, fazer uma força
danada e, no final, ficar quase todo o caldo no bagaço que a gente jogava fora.
Porque que não inventaram isso antes? Tão simples e tão barato!”. Nem vou
falar o que falava ele do relógio a pilha, exibido e mostrado à toda visita que
aparecia...
-
Um ano de duração, sem dar corda!...
Só
faltava o milagroso relógio falar!...
Ave Maria!
Benedito Franco
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