PADRE RAFAEL VIEIRA CSsR* |
* Missionário Redentorista, Pároco da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro – Brasília-DF
O inimaginável acabou acontecendo e uma cilada financeira
representada pela dívida pública ameaça a maior potência
econômica da terra a ir parar no vale dos caloteiros
Pessoas da minha geração aprenderam a associar capitalismo com a imagem dos Estados Unidos da América. Fomos educados a reconhecer, na política e na economia desse país, a mais elaborada e vitoriosa forma de explorar o ser humano em benefício do acúmulo do dinheiro, que resulta na estrutura de uma sociedade formada por opressores e oprimidos. Os primeiros são os donos do capital e dos meios de produção. Os outros são os trabalhadores. Era simples assim, a equação ideológica que fazíamos nas décadas de 60 e 70 do século passado. E para aqueles que, entre nós, faziam essa leitura no interior de uma comunidade da Igreja, a história era ainda mais simplificada com a aparição de um sentimento de nojo pelos norte-americanos e de uma simpatia gratuita pelos regimes que adotavam o socialismo. Amávamos o termo “revolução” e não perdíamos uma única chance de dizer a qualquer autoridade norte-americana que aparecesse por aqui: “go home!”. O tempo passou. O socialista leste europeu virou fumaça e parecia, até poucos dias atrás, que a vitória impiedosa do capitalismo não seria ofuscada. Não foi bem assim. Os Estados Unidos estão em pânico.
Independente da solução que o governo de Barack Obama encontrar com a chancela do Congresso ou não, a economia norte-americana está numa das piores fases da história recente. Se não fosse a crise promovida pela quebra do crédito imobiliário e os megaescândalos de especulação financeira que pipocaram há dois anos e colocaram o mundo inteiro à beira de um colapso, essa de agora poderia ser considerada a mais grave tensão da vertiginosa movimentação econômica dos Estados Unidos. Aumentar teto de endividamento nunca foi problema para os governos anteriores e com Obama não será diferente. O embate entre republicanos e democratas com os olhos fixos nas eleições presidenciais do ano que vem pode não possibilitar a saída espetacular do impasse, mas vai garantir que os Estados Unidos não joguem na latrina seu principal patrimônio: o orgulho nacional. Tanto uns quanto outros são cheios disso e não deixarão a “grande América” passar vergonha.
Quase todos os dias, ouço os comentários da Miriam Leitão na Rede CBN. Ela que é dona de uma das melhores análises econômicas na mídia brasileira já me deixou sossegado quando disse: “Se o impensável acontecer, todos os fundos de pensão, que são os maiores investidores do mundo, teriam que sair dos títulos mericanos, porque eles são obrigados por lei, estatuto ou regulação a só aplicar em papéis seguros. As empresas e bancos americanos também seriam rebaixados. A China seria afetada porque é o maior detentor individual de dívida americana. O Brasil é o quarto. É uma espiral negativa em escala mundial. Por isso, é mais fácil acreditar que eles não serão loucos a esse ponto e vão chegar num acordo”. Mesmo que não caia do modo mais tradicionalmente conhecido, essas circunstâncias atuais já desenham a queda de um império até ontem considerado inabalável.
Olhando para trás e vendo como tudo mudou tão rapidamente no horizonte das nossas certezas sobre economia e política, fico pensando se não seria melhor abaixar a bola em relação ao rápido crescimento do consumo no Brasil. Os norteamericanos tocam sua orquestra financeira por meio de um consumo estratosférico. Não me parece ser o melhor caminho, mesmo entendendo patavina do assunto. Aliás, você já parou para pensar no que significa “patavina”? Uma vez ouvi a explicação sobre o significado dessa expressão feita pelo saudoso e querido Pe. Tito Cardoso. Ele, todo pimposo, para esclarecer a origem da expressão lembrava-se do seu xará, o historiador romano Tito Lívio que viveu no último século antes de Cristo. Lívio nasceu na cidade de Pádua, que na época se chamava Patavium. Ele foi gramático e político e escrevia num estilo dificílimo no dialeto da região. Uma região marcada pela influência de muitas línguas por causa da passagem de pessoas vindas da França, Bélgica e Alemanha. Sua literatura era considerada de alta qualidade, mas muito rebuscada. Desse modo, as pessoas liam e não entendiam nada. Passaram a dizer, então, que quando não se entende bem alguma coisa, a pessoa não entendeu “patavina”. Saudade do Pe. Tito e sua expressão marcante no início de toda pregação: “meus amados”. Deus me deu a graça de fazer parte da comunidade que se despediu do Pe. Tito, em Campinas, no dia 3 de fevereiro de 2007
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