080 - Navio - A
Eufóricos e apreensivos, minhas duas filhas, Tatiana com seis anos e Fernanda com cinco, e eu iríamos embarcar em um grande navio de origem portuguesa, o Funchal. Embarcaríamos no Rio rumo a Santos, Montevidéu, Mar Del Plata e Buenos Aires - em companhia de papai, de duas irmãs, Rose e Celma com seus dois filhos, ainda pequenos, a Tutuca e o Kid.
A entrada no navio, anoitecendo, nada parecido com o que pensara ou sonhara... deixava de ser um sonho, era realidade - sonho do qual papai me falava desde eu criança, quando nem ele, e muito menos eu, conhecíamos o mar ou o navio!
O navio zarpou do porto do Rio, atravessando a Baia de Guanabara, adentrando mar alto, emoldurado por luzes de Copacabana... Ipanema... Leblon... Barra... coisa doutro mundo!... Luzes! Luzes!... e mais luzes!... Maravilha!... a oitava... O Cristo, uma das sete, nos olhando e nos abençoando ao longe – e ainda, de braços abertos, dava-nos um adeus e nos desejava boa viagem.
No primeiro jantar, fez-se notar cada passageiro com suas características: o comandante na farda reluzente de medalhas, brasões e condecorações; o Ministro da Aeronáutica de Portugal e esposa - simples e simpáticos os dois; a coroa chique e a humilde... e os jovens com toda beleza e presença; a gentileza dos tripulantes e os garçons com dois uniformes nos jantares – um para o prato de entrada e o outro para o prato principal; o conjunto musical com gente alegre... Enfim, uma plêiade de gente bonita e de bem com a vida.
Demorei a dormir; as meninas, com cinco e seis anos, a Tatiana e a Fernanda, cansadas do tanto visto e novidades mil... desmaiaram naquele pequeno e delicioso camarote balançante - o que sonhavam elas?...
O navio, com quinhentos passageiros e mais da metade disso como tripulantes rigorosamente uniformizados.
Acordamos beirando Santos, com a Serra do Mar e imensos navios nos olhando e nos observando de perto, logo ali, quase encostados em nós. Passamos o dia no porto, onde tudo é plural. A Casa do Café, ou Museu do Café, vale a pena ser visitada.
Durante três noites e três dias andamos em mar alto e, de quando em vez, avistávamos algumas ilhas e as costas de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul - o Uruguai foi notado quando as águas deixaram de ter o azul profundo para um marrom barrento e sem as altas ondas. Uma correnteza se fazia sentir - o Estuário do Plata. Montevidéu à vista! Na piscina, cheia com água do mar, agora água barrenta.
Um lauto café da manhã e a missa na capela. O almoço servido bem à vontade, as lanchonetes e bares dia e noite, e o jantar sempre de gala, onde as mulheres se exibiam com vestidos de grife e jóias de ouro, platina e diamantes.
De dia, a piscina sempre cheia; as máquinas caça-níqueis engoliam os escudos portugueses e o cassino lotado de viciados em jogos, ou os curiosos.
De noite, o baile no salão de festas, com uma ótima orquestra e os barzinhos bem freqüentados. A animação dos jovens contagiava a todos.
O enjôo, pelo balanço do navio, deixou muita gente de cama – trabalho para o médico a bordo e para a Rose, médica, requisitada pelo comandante.
Previsão de que, em cada cidade que chegássemos, sairíamos para visitá-la e ver as atrações turísticas, nela ou arredores.
Benedito Franco
Navio - B = Montevidéu, Piriápolis e Punta del Este.
Navio - C = Buenos Aires, Ciudad de los Niños e La Plata.
Não basta estender a mão para o outro e, sim, ajudá-lo a desprender-se de sua cruz.
NOSSA OBSERVAÇÃO:
Caro Benedito,
Pesquisando uma imagem do Navio Funchal na internet, encontrei esse blog (http:experienciadeviagem.blogspot.com)que faz referência ao navio e um pouco de sua trajetória:
quinta-feira, 10 de junho de 2010
Bilhete de João Pereira (1981)
A história é a seguinte: nas temporadas no navio Funchal, na época de bandeira portuguesa e fretado pela Abreu, o diretor de cruzeiros era o João Francisco Ribeiro Pereira, um diplomático e elegante guia executivo da Abreu para operações mais complexas como cruzeiros marítimos e viagens de longo curso (Ásia, Oceania, Oriente Médio). Eu trabalhava na Abreu São Paulo e atuava como guia internacional e staff de bordo da operadora (cinco ou seis pessoa sob a direção do João).
No final de cada temporada (de 18 de dezembro a 8 de março) ele escrevia um bilhete para todo o staff e deixava na parede de nossa sala (veja postagem anterior), além de escrever bilhetes particulares para alguns dos colaboradores. Eu tinha 21 anos, fui seu assessor na temporada e recebi este bilhete:
Acima está a primeira página do bilhete que ele me deixou (são duas). Reproduzo o texto completo abaixo:
08 MAR 1981
Prezado Luiz Gonzaga,
Hoje terminou sua missão para a Agência Abreu a bordo do "N/M Funchal", temporada 80/81. Uma das melhores épocas de cruzeiros que este navio, desde 1973/74, fez na América do Sul.
Profissionalmente e dentro da missão ingrata e difícil que lhe confiaram e apesar de sua juventude você superou as expectativas, pois, talvez não se esperasse tanto. Foi demasiado bom.
Coisas negativas aconteceram desde 18/12/1980 até hoje, mas foram ultrapassadas, superadas, por boa vontade, espírito de sacrifício e amizade.
Ao deixar o turismo para se dedicar a outra especialidade lhe desejo que nela seja tão responsável e tenha sua boa vontade a favor do ideal escolhido.
Creia, pois, foi um prazer tê-lo conhecido mais de perto e gostei de como me ouviu, colaborou, especificou e resolveu um caso ou outro mais complicado.
Votos sinceros de tudo de bom para sua vida,
João F. Ribeiro Pereira
Explicações: Na época eu me mudava de São Paulo para Campinas e não sabia se na próxima temporada estaria a bordo. Fui sim e o próximo documento a ser postado é o bilhete de 30/03/1982.
De: Benedito Franco
ResponderExcluirEnviada: segunda-feira, 29 de novembro de 2010 9:18:20
Para: 'José roberto staliano'
Uma vez redentorista, sempre redentorista!
Caro José Roberto
Nesta semana que passou, tive a grata surpresa de receber a Revista Uneser, com três páginas de artigos e fotos que enviei. E hoje, recebo seu email com mais uma publicação feita por você – vi e apreciei todo o blog.
Grato a você e ao pessoal da revista. Meus artigos estão sempre a seus dispores.
Abraço amigo
Benedito Franco