PADRE RAFAEL VIEIRA CSsR
Encontrei-me com o Walter Falceta Júnior durante o trabalho de cobertura de uma assembléia geral dos bispos em Itaici, na virada da penúltima para a última década do século passado. Parece que faz muito tempo, mas não faz. Coisa de uns 15 anos. Naquela época, quando Monsenhor Arnaldo Beltrami era assessor de imprensa da CNBB e a gente aprendia com ele, todos os dias, como é que se faz jornalismo sobre a igreja, o Falceta era visto como um sujeito sério, competente e um promissor profissional. Nunca mais o vi. Nos anos seguintes, lia suas matérias no jornal O Estado de São Paulo e, cada vez, ficava mais impressionado com a leveza e a precisão dos seus textos. Outro dia, numa pesquisa que fiz para produzir um programa sobre pedofilia para a TV Aparecida, deparei-me com um precioso depoimento dele sobre o caso de infâmia e de calúnia sofrido pelo Padre Julio Lancelotti e, me chamou a atenção, a análise que Falceta faz sobre o tipo de trabalho jornalístico feito pela revista Veja. Nesse texto ele usa, de forma apropriadíssima, a expressão “imprensa de latrina”.
Ocorre uma reincidência semanal na maneira com que essa revista trata os principais assuntos do país. Do alto de sua tiragem, protegida pelo dinheiro que a sustenta e confortavelmente instalada numa pretensa posição de “oposição” ao governo federal, a revista se dá o direito de distorcer, induzir e vaticinar contra tudo e todos e permanece sempre incólume. Suas capas são, particularmente, verdadeiros ícones do modo errado de lidar com a informação. Tomemos o exemplo mais recente que tem características de fácil compreensão por todas as pessoas minimamente expostas ao derramamento midíatico das últimas semanas. Edição n. 2057 de 23 de abril de 2008. Na capa, a revista encerra o caso do assassinato da menina Isabella Nardoni. Antes mesmo que tivessem sido realizados os procedimentos legais de investigação sobre esse caso que engessou o sistema de comunicação brasileiro. Uma foto do casal dentro de um carro envolto em sombras, uma frase com letras pequenas de cor amarela dava o fundamento de uma manchete, “para a polícia, não há mais dúvidas sobre a morte de Isabella”. E em letras enormes, a sentença: “foram eles”.
Todas as evidências divulgadas, até agora, estão mostrando que o veredicto pode ser este alardeado pela revista, mas a questão continua: é esse o papel da imprensa? Antecipar as conclusões da justiça, estabelecer onde está a verdade dos fatos ainda que eles não tenham sido devidamente apurados? No caso dos Nardoni nem tem tanto perigo porque a exploração exaustiva dos detalhes do crime não deixam grandes possibilidades de erro, mas é exatamente nessa forma contundente de atuar que está o grande sinal de desvio de conduta do jornalismo da Veja. Seus profissionais comportam-se como se fossem os únicos a conhecer a verdade e apontam o dedo contra todos os atores sociais na área política, econômica, social, policial com toda arrogância e prepotência. Se no caso dos Nardoni, os indícios aparentam ser muito fortes, não é sempre assim que os fatos se apresentam na cena brasileira e a revista se comporta sempre desse mesmo modo: categórica, incisiva e, muitas vezes, sem o fundamento necessário.
O Falceta desmantela uma matéria publicada na revista a respeito do Padre Lancelloti e oferece informações que somente um profissional como ele, que conhece por dentro o funcionamento da revista – afinal, ele já trabalhou lá - podia fazer. Ele não economiza nas cores: “À margem direita do rio, empina-se, arrogante, a torre do "pecado", hoje convertida em bunker dos corleones da comunicação. Entre tantos colegas de boa índole, mistura-se o que há de pior em nossas fileiras, empenhados num maquiavélico processo em que a manipulação da doxa tem por objetivo destruir a episteme. O panfleto mente! Depois, distorce, trama, sabota, e agride. Em seus quadros, mantém os mais obstinados inimigos da verdade, dedicados a restaurar preconceitos, atiçar ódios e instituir intolerâncias. Mais que tudo, entretanto, a colorida cartilha do mal esforça-se por injetar nas veias da classe média a desconfiança e o medo”. Falceta se refere ao que escreveram na revista sobre o Padre Lancelloti, mas os adjetivos servem perfeitamente bem para o que ocorre sempre na revista e que chega às bancas todas as semanas.

Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado por comentar. Sua participação é muito importante para nós. Deixe seu e-mail para podermos lhe contatar.