CONSAGRAÇÃO À NOSSA SENHORA APARECIDA NA VOZ DO PADRE VITOR COELHO CSsR

Ó MARIA SANTÍSSIMA, PELOS MÉRITOS DO SENHOR JESUS CRISTO QUE EM VOSSA IMAGEM MILAGROSA DE APARECIDA ESPALHAIS INÚMEROS BENEFÍCIOS SOBRE O BRASIL, EU, EMBORA INDIGNO DE PERTENCER AO NÚMERO DOS VOSSOS SERVOS, MAS DESEJANDO PARTICIPAR DOS BENEFÍCIOS DA VOSSA MISERICÓRDIA, PROSTRADO A VOSSOS PÉS, CONSAGRO-VOS O ENTENDIMENTO, PARA QUE SEMPRE PENSE NO AMOR QUE MERECEIS. CONSAGRO-VOS A LÍNGUA, PARA QUE SEMPRE VOS LOUVE E PROPAGUE A VOSSA DEVOÇÃO.CONSAGRO-VOS O CORAÇÃO, PARA QUE, DEPOIS DE DEUS, VOS AME SOBRE TODAS AS COUSAS.RECEBEI-NOS, Ó RAINHA INCOMPARÁVEL, QUE NOSSO CRISTO CRUCIFICADO DEU-NOS POR MÃE, NO DITOSO NÚMERO DOS VOSSOS SERVOS. ACOLHEI-NOS DEBAIXO DA VOSSA PROTEÇÃO. SOCORREI-NOS EM NOSSAS NECESSIDADES ESPIRITUAIS E TEMPORAIS E, SOBRETUDO, NA HORA DA NOSSA MORTE. ABENÇOAI-NOS Ó MÃE CELESTIAL, E COM VOSSA PODEROSA INTERCESSÃO FORTALECEI-NOS EM NOSSA FRAQUEZA, A FIM DE QUE, SERVINDO-VOS FIELMENTE NESTA VIDA, POSSAMOS LOUVAR-VOS, AMAR-VOS E RENDER-VOS GRAÇAS NO CÉU, POR TODA A ETERNIDADE. ASSIM SEJA! ...PELA INTERCESSÃO DE NOSSA SENHORA APARECIDA, RAINHA E PADROEIRA DO BRASIL, A BÊNÇÃO DE DEUS ONIPOTENTE, PAI, FILHO E ESPÍRITO SANTO, DESÇA SOBRE VÓS E PERMANEÇA SEMPRE.AMÉM!

ATUALIZAÇÃO



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19 de outubro de 2009

CARTA DO SUPERIOR GERAL

Visitando o site da Congregação encontrei a carta onde Pe. Joseph Tobin apresenta suas reflexões finais como Superior Geral após 18 anos de serviço, seis como Conselheiro Geral e 12 como Superior Geral.
Quando perguntado se ele desejava dar uma última entrevista à SCALA junto com a publicação de sua carta, ele respondeu sorrindo:

“Escreva que estou pedindo a todos que leiam a carta.” Então, por gentileza, leiam a carta!


Mesmo sendo um texto bastante longo, vale a pena lê-lo, pois nos mostra um quadro bastante real da Congregação e se nós invocamos o lema "UMA VEZ REDENTORISTA, SEMPRE REDENTORISTA", devemos acompanhar seus passos...



Carta aos Confrades


Chamado a ser apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus

(1Cor 1,1)



8 de setembro de 2009

Natividade de Nossa Senhora



Prot. N° 0000 159/2009



Caros Confrades,

1. Ao entrarmos no último mês do sexênio, os olhos da Congregação estão voltados para o XXIV Capítulo Geral. Embora espere poder oferecer ao Capítulo um relatório sobre o estado de nosso Instituto, eu gostaria de dizer algo diretamente a todos os membros da Congregação, que confiaram o serviço de Superior Geral a um irmão indigno. Saúdo também as Irmãs Redentoristas e outros religiosos e religiosas e os missionários leigos que compartilham de nosso espírito, pedindo que leiam essa reflexão do ponto de vista de sua própria vocação no Corpo de Cristo. Quem ler talvez irá perceber quanto amo a nossa Congregação e a esperança que tenho no nosso futuro.

2. Durante os últimos doze anos, muitas vezes me perguntaram como foi que recebi este ministério. Tenho sido tentado a responder com os três “c” citados por nosso santo Fundador: capitolo…cavallo…cieco – o Capítulo é um cavalo cego! No entanto, acho que em 1997 Deus julgou que eu não amava bastante a Congregação, então me deu doze anos de intenso aprendizado na magnificência de nossa vocação.

3. Esta carta pretende continuar um convite que foi feito formalmente aos Redentoristas dois anos atrás: que nós consideremos nosso compromisso de consagrados que se propõem seguir os passos do Cristo Redentor pregando o Evangelho aos pobres. Espero que concordem que um olhar honesto sobre o significado de nossa profissão religiosa não é apenas um resultado natural do trabalho dos últimos Capítulos Gerais, mas também uma tarefa particularmente urgente à luz da situação atual da Congregação.

4. Na primeira seção desta carta, vou ressaltar algumas circunstâncias que nos obrigam a lançar um olhar destemido e corajoso sobre o nosso modo de seguir a Jesus Cristo. Vocês poderão completar esta descrição com experiências de sua própria situação social e eclesial. Na segunda seção, vou tentar avaliar essa realidade à luz do Evangelho e de nosso patrimônio espiritual. Em vez de tentar propor todos os critérios que devem nos guiar hoje, espero indicar um elemento que é particularmente crítico para a fidelidade criativa à nossa vocação. Finalmente, vou propor algumas linhas comuns de ação com o objetivo de encorajar nossa unidade nos elementos essenciais, respeitando ao mesmo tempo a diversidade existencial dentro da Congregação.

I. VER

Mas quando ele vier, o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à verdade completa. Pois não falará por si mesmo, mas falará de tudo o que ele ouvir e vos anunciará as coisas futuras. (Jo 16,13)

5. O que pode o Espírito Santo ensinar-nos sobre a nossa maneira particular de discipulado, a vita apostolica, vida que compreende “a um só tempo, a vida especialmente dedicada a Deus e a obra missionária dos Redentoristas” (Const. 1)? O que pode o Espírito estar ensinando aos Redentoristas hoje? Como é que ouvimos o Espírito da Verdade, que nos anuncia as coisas futuras (Jo. 16,13)?

6. Por onde podemos começar? A vida apostólica redentorista é, antes de tudo e principalmente, vida. Então, um ponto de partida valioso para considerar nossa maneira de discipulado é buscar sinais de vitalidade entre os missionários Redentoristas de hoje. Esta busca é particularmente crítica para os Redentoristas já que, desde os primeiros dias, a nossa Congregação tem tido uma percepção particular da abundância de vida que se encontra em Jesus Cristo; daí nosso lema Copiosa apud Eum Redemptio. A busca de vitalidade em nossa vida apostólica não pode ser um exercício de fantasia ou veleidade. Embora ainda não possamos ver claramente o que o Espírito Santo está gerando no mundo, na Igreja e portanto, em nossa Congregação, podemos no entanto identificar sinais de nova vitalidade.

O fascínio exercido sobre os Redentoristas hoje pela pessoa de Jesus

7. Estou convencido de que a maioria dos Redentoristas amam a Jesus Cristo e exprimem esse amor por meio da generosidade, sacrifício pessoal e perseverança. Quando pregam, os Redentoristas falam sobre Jesus como uma pessoa que eles conhecem intimamente, uma pessoa que manifesta plenamente a beleza e a força do amor de Deus, precisamente na cruz [1] , e em cujo Evangelho descobrimos o caminho da verdadeira libertação e da solidariedade.

8. Nas visitas às Unidades da Congregação, os membros do Conselho Geral têm uma oportunidade privilegiada para ver o tipo de força que os Redentoristas descobrem no Redentor. Essas visitas demonstram que o perfil do Redentorista contido na Constituição 20 não é uma fantasia idílica. Os Conselheiros Gerais e eu temos testemunhado pessoalmente o tipo de heroísmo que caracteriza a Congregação: confrades “abnegados, em disponibilidade constante para as coisas mais difíceis”, quer a tarefa assumida seja uma missão particularmente difícil, quer se trate simplesmente de perseverar em sua vocação quando, como Abraão, devem eles “esperar contra toda esperança” (Rm 4,18).

9. A fonte desse amor audaz é o Redentor, a quem os Redentoristas continuam a “seguir contentes” (Const. 20). O primeiro e mais importante sinal de vitalidade em nossa vida apostólica é a constante redescoberta e o renovado compromisso dos Redentoristas com Jesus Cristo, que é o caminho, a verdade e a vida (Jo 14,6).

O desejo de nascer de novo

10. Longe de ser uma espécie de baluarte que pretende existir fora da história, a Congregação luta para continuar sua peregrinação com criativa fidelidade às inspirações do Espírito Santo. O Concílio Vaticano II desafiou os religiosos a começar um processo de renovação guiado por critérios essenciais: um retorno à Palavra de Deus, especialmente aos Evangelhos, um retorno ao espírito do fundador e aos valores fundamentais das origens, e a necessidade de dar uma resposta concreta aos sinais dos tempos.[2] Os princípios do decreto Perfectae Caritatis e a doutrina do Magistério na esteira do Concílio foram abraçados com entusiasmo pela Congregação e, até hoje, a renovação tem produzido resultados concretos.

11. As nossas Constituições e Estatutos oferecem normas que estão claramente enraizadas na intuição espiritual de Afonso, embora sejam bastante flexíveis para permitir a necessária inculturação de nossa vida apostólica na vasta panóplia de culturas nas quais a Congregação exerce sua missão. Alguns confrades têm dedicado décadas de suas vidas à cuidadosa pesquisa de nossa história e de nosso patrimônio espiritual e têm produzido uma riqueza de novos subsídios para entendermos nossa vida apostólica. Nos últimos quarenta anos, temos aprofundado nosso apreço pela vida e pela inspiração original de Santo Afonso e por seus métodos missionários e sua espiritualidade. Sabemos muito mais a respeito das vidas dos outros santos e beatos nossos, como também sobre a aventura de graça que tem sido a história da Congregação nesses duzentos e setenta e seis anos.

12. O fruto dessas pesquisas não fica juntando poeira nas bibliotecas das comunidades. Muitos confrades participam de cursos sobre a nossa espiritualidade e nossa história em Roma e também em nível provincial e regional. As reuniões regulares dos Superiores Maiores trabalham com afinco para avaliar os pontos fortes e fracos dos esforços de suas Unidades e um certo número de Superiores Provinciais desejam assumir iniciativas que respondam às novas urgências pastorais. E agradeço a Deus por um louvável grau de descontentamento no seio da Congregação! Dizemos uns aos outros que podemos ser melhores que o status quo e recusamos ser seduzidos pela mediocridade. Muitos de nós esperam ser mais coerentes em nossas decisões e mais proféticos em nosso estilo de vida. Longe de ser uma lamentação inútil, essa insatisfação pode ser um sinal de vitalidade e indicar abertura à conversão.

A importância fundamental da missão

13. As Constituições renovadas insistem em que a nossa caridade apostólica, “pela qual os Redentoristas participam da missão de Cristo Redentor” (Const. 52), dá unidade à vida redentorista, vida esta que encontra sua plena expressão na vita apostolica. Sucessivos Capítulos Gerais têm lembrado à Congregação que nem toda atividade pastoral ou estilo de vida pode ser justificado como uma expressão coerente de nosso carisma. Em 1985, o XX Capítulo Geral desafiou a Congregação a uma proclamação explícita, profética e libertadora do Evangelho aos pobres, enquanto, ao mesmo tempo, nos deixamos também evangelizar por eles [3] . O XXI Capítulo Geral nos recordou que a nossa vida comunitária constitui o primeiro sinal de que somos pregadores do Evangelho; ademais, a nossa comunidade é uma presença eficaz do Reino de Deus no meio dos homens e mulheres. [4]

14. Por outro lado, a reflexão dos últimos anos levou muitos Redentoristas a vislumbrar uma missão que excita a nossa imaginação e nos convida a empreender iniciativas audazes e proféticas, que ultrapassam as fronteiras tradicionais para proclamar Jesus Cristo por meio da inculturação, do diálogo ecumênico e inter-religioso, como também novas formas de meios de comunicação, sempre mantendo a preferência pelos pobres e excluídos da sociedade. Embora as missões paroquiais e outras formas de pregação itinerante ainda gozem de uma posição privilegiada entre nós, temos descoberto novas possibilidades por meio do ministério em santuários, paróquias, casas de retiro, estações missionárias, meios de comunicação, direção espiritual e catequese.

15. Por outro lado, o debate sobre as características essenciais de nossa missão – tema que se tornou mais candente devido ao processo de reestruturação – nos relembra que não estamos dispensados de tomar decisões e devemos lutar para fundamentar nossas decisões em critérios que são propostos pelo Evangelho e por nossa compreensão do carisma redentorista. Como Afonso, Clemente e todos os nossos pais na fé, devemos decidir para quem somos chamados, como devemos viver e quais métodos pastorais são apropriados para desempenhar a missão que recebemos. Um novo apreço pela fundamental importância da missão naturalmente questiona toda tendência a “instalar-se em condições ou estruturas nas quais [nossa] atuação já não seria missionária” (Const. 15). Ao mesmo tempo, ao ressaltar a importância da vida comunitária e da espiritualidade, a reflexão dos últimos Capítulos Gerais acautelou os Redentoristas contra simplesmente reduzir a missão ao trabalho pastoral.

Fidelidade aos pobres abandonados

16. O Conselho Geral tem visto muitos exemplos da fundamental fidelidade dos Redentoristas aos pobres abandonados. Algumas dessas escolhas chegam a colocar em risco as vidas dos confrades. Penso nos Redentoristas que têm permanecido ao lado do povo sofredor do Iraque, nos confrades que estão na Costa do Marfim, região atormentada pela guerra civil e desertada pela maioria do clero, inclusive o bispo diocesano. Há Redentoristas que proclamam o Evangelho numa terra estrangeira, onde os resultados visíveis do seu trabalho são muito mais modestos do que poderiam esperar na sua Província de origem, como é o caso dos confrades brasileiros no Suriname e dos missionários poloneses na Sibéria. Algumas Províncias fundaram comunidades em novas situações culturais, como o apostolado entre os afro-colombianos em Buenaventura (Colômbia) ou os primeiros esforços para estabelecer uma presença missionária no Laos. Essas iniciativas demonstram a especial atenção que a Congregação continua a dedicar aos pobres, carentes e oprimidos (Const. 4), recordando-nos que é mais importante estar onde há uma urgência pastoral do que permanecer em igrejas bem estabelecidas com um impressionante número de participantes.

A busca de comunhão

17. Desde o começo, a Congregação tem estado bem perto das pessoas que ela serve e tem tentado de vários modos envolver leigos nos seus trabalhos missionários. Essa tradição recebeu novo impulso nas décadas recentes, a partir do XXI Capítulo Geral, que reconheceu a necessidade de abertura para a cooperação com os leigos e expressou apoio a iniciativas novas, inclusive a criação de uma nova figura na Congregação, o “Missionário Leigo do Santíssimo Redentor”. [5]

18. Embora haja ainda muito a fazer rumo a uma efetiva integração dos leigos em nossa missão, parece haver um crescente consenso na Congregação quanto ao valor de iniciativas partilhadas envolvendo Redentoristas e leigos. É também claro que tanto os leigos como os Redentoristas necessitam de formação teológica, pastoral e espiritual para garantir que essa associação dê testemunho de nossa igualdade essencial diante do Senhor, respeitando no entanto a vocação particular de cada um. A Congregação não vai desistir da busca de comunhão que possibilita uma missão partilhada a serviço da Igreja e da humanidade.A necessidade de uma espiritualidade renovada

19. Finalmente, os Redentoristas estão se esforçando para aplicar o patrimônio espiritual da Congregação às novas circunstâncias em que hoje vivemos e trabalhamos. Percebemos que o itinerário espiritual de confrades que nos precederam, a partir de Afonso, mas não só ele, nos dá preciosas intuições sobre o nosso modo de seguir a Cristo hoje. Nesta busca, precisamos ter pontos de referência claros e confiáveis que definem a orientação de nossa espiritualidade missionária. Nossa visão deve estar enraizada nos Evangelhos, no espírito de Afonso e na experiência real dos Redentoristas pelos séculos a fora. Obviamente, esta busca espiritual não pode deter-se no passado ou, o que seria mais danoso, procurar transportar de modo acrítico o passado para o presente. [6]

20. O Conselho Geral sente-se encorajado ao ver o reaparecimento dos retiros comuns em muitas Províncias, como também o interesse em publicações, seminários e cursos sobre os elementos essenciais da espiritualidade redentorista. Bom número de (Vice-) Províncias programou eventos especiais durante o ano de reflexão sobre a vida apostólica redentorista. Muitas vezes a atração dos leigos pelo nosso patrimônio espiritual estimulou os confrades a um estudo mais profundo e a um maior apreço por nossa herança.

21. Embora eu veja muitos exemplos de vitalidade em nossa vida apostólica hoje, a nossa Congregação, como a Igreja, passa por diferentes estágios na longa peregrinação da história. Não somos extraterrestres, isentos das mesmas forças que estão mudando profundamente as sociedades individuais e suas instituições, bem como o mundo como um todo. Algumas dessas forças podem obscurecer os sinais de vitalidade em nossa vida apostólica ou até mesmo levar-nos a deslocar a missão da Congregação da sua origem divina e reduzi-la simpesmente a tendências estatísticas, demográficas e culturais. Permitam-me apresentar algumas das mais inquietantes características desse problema.

As consequências de uma rápida diminuição nos números no Ocidente

22. Há um amplo testemunho para pôr à prova o otimismo dos Redentoristas hoje. Nas últimas cinco décadas, a nossa Congregação, como a maioria das grandes Ordens e Congregações masculinas, sofreu um drástico declínio no número de membros, especialmente na Europa Ocidental, América do Norte e Oceania. As razões deste fenômeno são muitas e complexas. Para os objetivos dessa reflexão, proponho ressaltar alguns resultados desse declínio, em vez de indagar suas possíveis causas.

23. As Unidades mais afetadas por esse declínio têm exercido um longo e notável papel na missão da Congregação. Não apenas exerceram grande influência na história da Igreja local da sua região particular, mas também implantaram a Congregação por todo o hemisfério sul. Um pequeno número destas Províncias continua assumindo grande parte do financiamento de projetos comuns da Congregação, como o Fundo de Solidariedade, a Academia Alfonsiana e o Governo Geral, ao mesmo tempo que discretamente oferece apoio direto a Unidades carentes no mundo inteiro. O número decrescente dos confrades e sua idade avançada inevitavelmente reduzem o alcance das possibilidades dessas Unidades, e o custo crescente do atendimento médico aos idosos limitou a soma do apoio financeiro que essas Unidades podem oferecer à Congregação. Mais ainda, essas Unidades têm obtido valiosas intuições sobre a complicada relação entre fé, religião e uma sociedade secularizada. O declínio da Congregação nessas regiões empobrece a vida da Igreja.

24. Além dessas consequências imediatas, porém, a visível falta de atrativo de nosso modo de vida entre os jovens do Ocidente tem produzido sérias dúvidas entre alguns bispos, leigos e até entre Redentoristas quanto ao futuro da Congregação e da própria vida consagrada. No seu governo rotineiro como também no planejamento para o futuro, muitas Unidades sentem-se obrigadas a cuidar mais da manutenção do que da missão e um vocabulário de contenção e diminuição tem substituído a linguagem de abundância que tradicionalmente estava associada com a vida consagrada [7] .

25. Postos perante um horizonte de possibilidades muito mais estreito, os confrades com freqüência exprimem uma tristonha resignação, até mesmo tristeza, ao relembrar a “idade de ouro” de sua Unidade. Não é exagero observar que a Congregação no Ocidente pode ser vítima de seu passado sucesso, ao recordarem os confrades aquele período histórico em que um número extraordinariamente elevado de candidatos se apresentavam, desencadeando assim a energia que possibilitou uma dramática expansão do ministério.

Passagem do legalismo para ... ???

26. A Congregação ainda está vivendo as conseqüências da passagem da Regra para as Constituições e Estatutos revisados. Desde o princípio, os Redentoristas codificaram certas normas destinadas a salvaguardar os valores mais apreciados do nosso modo de seguir a Cristo. Essas normas serviram para guiar a Congregação nas suas mais importantes decisões, ao mesmo tempo que transmitiam às sucessivas gerações a experiência espiritual da vida apostólica. Durante a maior parte de nossa história, o objetivo dos Redentoristas foi viver as prescrições da Regra como um caminho para a santidade e assim realizar a obra da Congregação. A observância era o valor fundamental. A Regra governava o nosso ministério e a vida da comunidade a tal ponto que, como se diz, podia-se ir a qualquer casa nossa em todo o mundo, que se encontravam grandes semelhanças no estilo de vida, até mesmo na mobília do quarto de cada confrade.

27. À luz da renovação iniciada com o decreto Perfectae Caritatis, a observância dos preceitos da Regra foi vista como uma ênfase exagerada na lei e em práticas ascéticas ultrapassadas, e também uma preferência pela letra da lei em detrimento do seu espírito.

28. Por sua vez, as Constituições e Estatutos revisados oferecem um rico conteúdo teológico e também uma real flexibilidade que permite sua “acomodação à diversidade de cada missão, salvo, porém, o carisma da Congregação” (Const. 96). Quando se examinam as Constituições e Estatutos à luz dos critérios indicados pelo n. 2 do decreto Perfectae Caritatis, não se pode duvidar de que eles “nos conectam com o espírito original do Instituto” e promovem “a adaptação desse espírito às novas condições do nosso tempo”. Contudo, deve-se perguntar se na realidade as Constituições estão se mostrando capazes de transmitir a vida redentorista? Refiro-me, naturalmente, ao papel visivelmente menor que as Constituições exercem na reflexão, nas decisões e na vida diária de muitas Unidades da Congregação.

29. Nas últimas décadas, enquanto as tradições e normas vão perdendo sua importância, atribui-se um valor crítico à experiência pessoal e à capacidade de cada indivíduo encontrar a Deus. Quando são filtradas por critérios subjetivos, as práticas e fórmulas antigas não mais favorecem uma experiência de Deus pessoalmente válida. [8] Isto pode ajudar a explicar a luta que as comunidades locais enfrentam para estabelecer uma vida regular de oração comunitária. Dezoito anos atrás, o XXI Capítulo Geral notou um desafio que persiste ainda hoje: “Ao deixarmos as práticas consideradas inautênticas ou inadequadas ao dia de hoje, não surgem novas práticas capazes de preencher o vazio que se criou”. [9]

30. A falta de familiaridade com as Constituições e sua notável irrelevância em boa parte da vida da Congregação priva os Redentoristas de uma linguagem comum como também de princípios com os quais podemos confrontar nossas vidas e fundamentar nossas decisões.

31. Quando uma Província tem que tomar decisões sobre métodos pastorais, desenvolver projetos de vida comunitária ou refletir sobre o início ou abandono de fundações, o debate é governado por convicções, atitudes ou opiniões que nem sempre têm muita conexão com os valores expressos nas Constituições. Continuam aparecendo dicotomias inúteis, embora em novas formas. Ouve-se falar menos de “Cartuxos em casa e apóstolos fora” e mais sobre “ser” versus “fazer”, “ativismo” versus “contemplação”, “missões” versus “paróquias”. Penso que esses e semelhantes exemplos de justaposição refletem uma fundamental desconexão com a espiritualidade das Constituições e Estatutos.

Clericalismo

32. Devemos perguntar-nos se está havendo ou não na Congregação o surgimento de um tipo de clericalismo que nos distancia da verdade da Constituição 54, a qual nos recorda que é a profissão religiosa (e não a ordenação) o ato que define toda a vida missionária dos Redentoristas. O clericalismo está enraizado na idéia de que em tudo o que se refere à religião, é direito e responsabilidade dos clérigos tomar as decisões e dar ordens, e o ofício dos leigos é executá-las. Esta espécie de clericalismo não está medrando na Congregação. Porém, pode haver um sutil mas real aumento de uma cultura clericalista, isto é, em ambiente no qual a vocação redentorista é reduzida à ordenação sacerdotal e a nossa missão é pensada em termos de ministérios de culto que são reservados aos sacerdotes. Dois fenômenos apontam para essa possibilidade mais profunda.

33. Primeiro, o número dos Irmãos Redentoristas continua a diminuir em praticamente todas as Unidades da Congregação. Há muitas razões por detrás desse fato, mas o que me preocupa são as Unidades que já não promovem mais a vocação para Irmão. Isto é particularmente inquietante nas Províncias ou Vice-Províncias que possuem um número saudável de estudantes clérigos, mas alegam que razões culturais explicam a ausência de Irmãos. Dizem que o povo considera o Irmão como “inferior” ao Padre – uma espécie de clérigo incompleto! Se o povo realmente pensa assim, então a Congregação tem uma oportunidade de desafiar esse sério equívoco com um exemplo de fraternidade no qual todos os missionários, por virtude de sua profissão (Const. 55), e todos os membros são iguais, cada qual à sua maneira tomando parte na vivência da vida e no exercício da missão à qual se dedicaram (Const. 35).

34. Um outro sinal inquietante é a notória facilidade com a qual confrades ordenados abandonam a Congregação para serem incardinados numa diocese. Essa passagem muitas vezes acontece no início da vida sacerdotal redentorista, vendo-se a incardinação como uma solução atraente para uma crise pessoal. Infelizmente, há bispos que parecem ansiosos por aceitar um sacerdote religioso, especialmente se ele é jovem ou tem formação especializada. O sacerdócio diocesano é uma valiosa vocação, mas é fundamentalmente distinta de nosso modo de discipulado. Quando um confrade é incardinado numa diocese, tenho ouvido dizer muitas vezes: “Pelo menos salvou-se o seu sacerdócio!” Que significa exaltar o sacerdócio e colocar em segundo plano a vida na qual ele é exercido, ou seja, a Congregação ou a diocese?

35. Além do clericalismo, pode haver muitas outras castas que dividem a Congregação. Um valor exagerado do “profissionalismo,” acompanhado de um modo peculiar de falar e de vestir, ou uma divisão em linhas ideológicas que caracterizam um confronto entre opiniões opostas sobre determinada questão teológica ou política, enfraquecem o testemunho global da Província. Diferenças étnicas, nacionais ou regionais criam embaraçosas barreiras entre os confrades. Como o clericalismo, essas fontes de fragmentação sugerem que para certo número de confrades, existem mais poderosos pontos de identificação do que a nossa comum profissão como Redentoristas.

A questão da dimensão profética

36. Atualmente muitos confrades comentam a diminuição do testemunho de nosso modo de vida: a dimensão profética de nossa vocação é fraca, ou mesmo ausente. Esta preocupação apareceu com força este ano em várias reuniões regionais, especialmente na da América Latina. Ainda que os confrades de outras regiões possam não exprimir essa preocupação com tanta ênfase, eu me pergunto se não existe um desconforto geral entre os Redentoristas, um sentimento aflitivo de que permitimos que a natureza radical da nossa vocação ficasse comprometida por um estilo de vida mais burguês, no qual o testemunho comunitário é neutralizado pela preferência pessoal. Sentimos que a vida redentorista nunca foi imaginada como uma carreira bem ponderada com horário regular, clara descrição de tarefas e toda sorte de garantias. Porém, muitas vezes não temos certeza sobre que tipo de testemunho dar: o que proclamar… o que denunciar?

37. Na primeira seção dessa carta, convidei vocês a pensar sobre o que o Espírito Santo pode estar nos dizendo sobre o nosso modo particular de discipulado, a vita apostolica. Examinando alguns aspectos da Congregação hoje, tentei indicar sinais de vitalidade e também razões para nos preocuparmos com nosso tipo de discipulado. Partindo de sua experiência pessoal, vocês provavelmente pensaram em outros exemplos de vigor e de declínio. Gostaria de iluminar a realidade da Congregação, considerando aquele que julgo ser o voto que pode dar uma crucial contribuição para a vida apostólica dos Redentoristas hoje: o voto de obediência. Antes que alguém se irrite e comece a ver fantasmas de autoritarismo e centralização, permitam que eu me explique.

II. JULGAR

Tende entre vós os mesmos sentimentos de Cristo Jesus… (Fl 2,5)

Os votos hoje

38. A profissão religiosa é o ato que define toda a vida missionária dos Redentoristas (Const. 54). A força dessa profissão não é simplesmente um compromisso de viver as consequências dos três votos, junto com o voto e juramento de perseverança. Mais que a aceitação de obrigações, a profissão religiosa representa um impulso do Espírito Santo, que leva os Redentoristas a não poupar nenhum esforço para chegar ao dom total de si mesmos como uma resposta ao Senhor que os amou primeiro (Const. 56). Os votos são certamente de grande conseqüência no processo diuturno da autodoação, mas isto ocorre também com o compromisso de levar “uma vida fraterna cheia de caridade apostólica”, conforme esclarece a nossa fórmula da profissão.

39. Para os Redentoristas, os votos devem ser vividos à luz da missão recebida pela Congregação e têm tanto a ver com a comunidade quanto com os confrades individualmente. No nível individual, os votos podem ser considerados uma determinação sobre como os Redentoristas lidam com a ordem social, com a sexualidade e com a propriedade. Juntos, os votos representam um compromisso público e livremente assumido de viver uma vida de autodoação, modelada segundo o exemplo do amor de Cristo por Sua Igreja. Como o Seu, nosso dom é total e irreversível. [10]

40. Pode ser útil, então, destacar um voto como tendo um valor único para a vita apostolica na primeira década do século XXI? Se este é o caso, qual deles? Quando se considera o testemunho evangélico dos votos no contexto dos acontecimentos atuais, pode-se alegar que a castidade religiosa oferece um testemunho singular diante dos escândalos públicos causados pelos abusos sexuais de clérigos e religiosos e diante da redução da expressão sexual a um impulso biológico necessário. Por outro lado, dada a nossa preferência pelos abandonados e entre eles, pelos pobres, certamente queremos entender melhor e viver com maior coerência o conselho evangélico da pobreza. Todavia, vou mostrar como a obediência tem uma função particularmente decisiva na vida apostólica hoje.

41. É praticamente um chavão afirmar que vivemos no meio de um mundo, de uma Igreja e de uma Congregação em rápida mudança. Nossa era é chamada de tempo de transição marcado por “grandes avanços na ciência e na tecnologia e também por poderosos meios de comunicação que às vezes colonizam o espírito”. [11] Temos a ambígua experiência da globalização que nos torna interdependentes ao mesmo tempo que solapa as identidades culturais particulares. Mas nossos dias também apresentam “momentos de kairos nos quais temos surpresas e percebemos que o Deus que fala é o Senhor da história”. Sentimos “uma sede e uma crise de significado que nos apresenta milhares de propostas e promessas”. [12]

42. Mesmo no “intervalo” da hora presente, a Congregação deve fazer escolhas. Não tem liberdade para ser volúvel nem pode determinar os critérios para suas opções apenas com suas próprias luzes. No meio de uma cacofonia de vozes que procuram “colonizar” seu espírito, a Congregação precisa distinguir a voz d’Aquele que nos chamou para sermos “colaboradores, companheiros e ministros na grande obra da Redenção pregando aos pobres a Palavra da salvação” (Const. 2). Porque os Redentoristas somos chamados a responder a situações de real necessidade pastoral (Const. 5), nossas escolhas precisam ser avaliadas regularmente, para que não nos permitamos “instalar-nos em condições ou estruturas nas quais [nossa] atuação já não seria missionária” (Const. 15).

43. A agitada experiência de mudança em nosso Instituto nas cinco últimas décadas como também o fluxo do mundo hodierno exigem que os Redentoristas tenham corações que ouvem e discernem, livres para seguir as inspirações do Espírito Santo. Assim, proponho que demos particular atenção ao voto de obediência como um compromisso em vista de uma corresponsável busca da vontade de Deus conforme o carisma da Congregação.

44. Embora uma consideração completa do voto deva incluir a função da autoridade na vida apostólica como também a obrigação dos religiosos de obedecer às legítimas determinações de seus superiores, nesta reflexão gostaria de pensar sobre o nosso voto no contexto radical descrito por Paulo VI: “Mais ainda que uma obediência puramente formal e legalista à lei da Igreja ou submissão à autoridade eclesiástica, [a obediência] é uma penetração e aceitação do mistério de Cristo, o qual, pela obediência, nos salvou. É uma continuação do Seu gesto fundamental: dizer Sim à vontade do Pai.” [13] A obediência neste sentido fundamental está em sintonia com a Palavra de Deus e com o rico patrimônio espiritual da Congregação e nos ajudará a distinguir a voz de nosso Mestre e a reconhecer o kairos dentro do caos de nossos tempos.

Uma pergunta e uma resposta

45. Os Evangelhos apresentam certo número de “histórias de vocação,” relatos que contam como Jesus faz um chamado que é aceito ou rejeitado por Seus ouvintes. Minha “história” favorita é todo o Evangelho de João, que começa com uma pergunta e termina com um convite. As primeiras palavras de Jesus são “Que estais procurando?” (Jo 1,38); o Evangelho termina com Suas palavras a Pedro “Segue-me” (Jo 21,22). À diferença do chamado dos apóstolos nos Sinóticos, as primeiras palavras de Jesus a André e ao outro discípulo são um apelo a seu desejo, seus sonhos, seus ideais: “Que estais procurando?” O Evangelho é a história do surpreendente encontro entre o Deus que “tanto amou o mundo”, e a fome mais intensa do coração humano. O chamado a seguir vem depois da revelação do mistério pascal, no qual o plano salvífico do Pai é plenamente manifestado.

46. A procura de Deus sempre foi o programa de toda e qualquer existência sequiosa de absoluto e de eterno. [14] As grandes tradições religiosas espelham essa procura, como também as sociedades secularizadas, nas quais homens e mulheres procuram algum tipo de sentido na vida, na morte, no amor e no sofrimento sem referência a uma fé revelada. Como Paulo no Areópago, se prestamos atenção nos “santuários” que essas sociedades constroem, podemos discernir muitos altares ao Agnostos Theos (cf. At 17,23).

47. Para os Redentoristas, a pergunta sobre o significado último encontra a resposta definitiva em Jesus Cristo. Junto com nossos irmãos e irmãs na fé, confessamos: “Mestre, a quem iremos? Tu tens as palavras de vida terna. Nós acreditamos e sabemos que és o Santo de Deus” (Jo 6,68-69). Porém, mesmo quando chegamos à alegre certeza de que encontramos o que estávamos buscando (cf. Jo 1,41), a busca continua.

48. A nossa profissão é “o ato que define a nossa vida missionária” (Const. 54), mas é também a continuação da procura. Penso na imagem de Jesus que está na capela da Cúria Geral, que o representa em perfil de três-quartos. Permanece sempre um lado oculto do Mestre, de modo que a nossa oração continua sendo: “Vossa face, Senhor, eu procuro” (Sl 27,8).

A obediência é devida somente a Deus

49. O ponto de partida necessário para considerar a obediência é a fé, nossa resposta à mais fundamental vocação que recebemos no batismo. No seu sentido teológico, a obediência é devida somente a Deus. Qualquer outra manifestação de obediência religiosa é uma mediação, um meio para um fim, dirigido para a única genuinamente importante e decisiva vontade na vida de um cristão e, portanto, de um Redentorista. [15]

50. A obediência reconhece a primazia de Deus sobre tudo e sobre todos. [16] Assim, em suas mais fundamentais identidades, a Congregação e a Igreja não estão estruturadas em duas classes, os que mandam e os que obedecem. A todos os Seus discípulos, Jesus diz: “Não tendes senão um Mestre, e todos sois irmãos” (Mt 23,8). Na Igreja cada qual deve buscar a vontade de Deus e todos são chamados a serem obedientes, pois quem faz a vontade do Pai é “irmão, irmã e mãe” para Jesus Cristo (Mt 12,50).

Cristo é o modelo da obediência

51. As Constituições reconhecem que aos Redentoristas foi dado um modelo visível de como devemos buscar e viver a vontade de Deus na história. A primeira constituição sobre o voto de obediência começa com as palavras: “A exemplo de Cristo, que veio para fazer a vontade do Pai, e dar a vida para a redenção de muitos … ” (Const. 71). A obediência à vontade de Deus não era algo acrescentado à personalidade de Cristo, mas sim sua plena expressão: “Meu alimento é fazer a vontade d’Aquele que me enviou” (Jo 4,34). [17] Como Seus “colaboradores, companheiros e ministros na grande obra da Redenção”, nós também somos chamados a uma obediência que continua a missão dada a Cristo pelo Pai.

52. Então, quando nós Redentoristas falamos sobre a “missão” da Congregação, estamos falando de obediência, não de slogans surrados ou de respostas pré-fabricadas. Por este voto, estamos “buscando o Reino de Deus e participando intimamente do mistério pascal de Cristo, que é mistério de obediência” (Const. 71).

53. O ponto de referência é Cristo e o mistério de Sua kenosis. A expressão concreta da missão na história não é sempre evidente por si; por isso buscamos vontade de Deus num espírito de fé e de amor. Santo Afonso nos exorta a continuar esta busca, ensinando que a nossa verdadeira realização vem do Deus-Amor, que tanto merece nosso amor, mas a perfeição do amor de Deus consiste em unir nossa vontade com a Sua. [18]

O que é «Vontade de Deus»?

54. O que é esta “vontade” do Pai que devemos buscar e – como Cristo – procurar realizar dentro da estrutura de tempo e circunstâncias em que a Congregação se encontra? A resposta pode ser encontrada nas primeiras palavras da oração que Jesus nos deu: agir de tal modo que o Pai seja reconhecido como o único Santo, que seu Reino histórico e escatológico venha e que Sua vontade seja feita assim na terra como no céu (cf. Mt. 6,9-10) [19] . A Vontade Divina começa a ser feita quando cremos no Filho enviado pelo Pai por amor ao mundo (Jo 3,16s) a fim de que ninguém pereça (cf. Jo 6,40). O ponto invisível de referência para a vontade de Deus é o extravagante amor do Pai (Mt 5,42-48); seu ponto de referência visível é a atitude de Cristo para com os que Ele amou (cf. Jo 15,9-17). [20]

55. São Paulo faz uma lista de ações visivelmente exemplares que finalmente são inúteis, se são feitas sem amor (1Cor 13,1-3). Do mesmo modo, Santo Afonso ensina que não basta fazer coisas louváveis, se nosso comportamento não está em conformidade com a vontade de Deus. [21] Assim, também, nem toda opção pastoral assumida por um confrade, uma comunidade local ou uma Província pode ser julgada consentânea com o carisma da Congregação, se a escolha não é feita em harmonia com a vontade de Deus. Santo Agostinho sucintamente observou: Martyres non facit poena sed causa – não é a pena mas a causa que faz os mártires. [22]

56. Contudo, a autêntica experiência de Deus sempre permanece a experiência de alteridade [23] Como nos recorda o Papa Bento XVI em sua segunda encíclica, “Por grande que seja a semelhança verificada entre o Criador e a criatura, sempre maior é a diferença entre ambos.” [24] O profeta convida a “procurar o Senhor enquanto pode ser encontrado, invocá-lo enquanto está perto” (Is 55,6) e imediatamente adverte contra toda falsa intimidade ou fácil familiaridade: “Pois meus pensamentos não são vossos pensamentos, e vossos caminhos não são meus caminhos, diz o Senhor. Porque quanto o céu se eleva sobre a terra, tanto meus caminhos se elevam sobre vossos caminhos, e meus pensamentos sobre vossos pensamentos” (Is 55,8-9).

57. A sublime “alteridade” de Deus significa que devemos buscar sua vontade através de meios coerentes com a Sua revelação. Primeiro e acima de tudo, a real obediência de todo discípulo e “aderir à Palavra com a qual Deus se revela e comunica”. [25] O seguimento de Cristo conforme apresentado no Evangelho é a norma fundamental da vida religiosa e deve ser considerado como a regra suprema na Congregação. [26]

58. Uma outra mediação da vontade de Deus é o ofício magisterial da Igreja, que tem a tarefa de dar uma interpretação autêntica da Palavra de Deus, ensinando com autoridade em nome de Jesus Cristo. No entanto, esse Magistério não está acima da Palavra de Deus, mas sim ao seu serviço [27] . Pode ensinar somente o que lhe foi transmitido. Por mandato divino, com a assistência do Espírito Santo, piamente ausculta aquela Palavra, santamente a guarda e fielmente a expõe. [28]

59. Existem outras mediações da vontade de Deus que são específicas da vocação de cada um na vida. Os religiosos e as religiosas são chamados a seguir o Cristo obediente dentro de um “projeto evangélico ou carismático, inspirado pelo Espírito e autenticado pela Igreja.” [29] Em sua exortação apostólica Vita Consecrata, o Papa João Paulo II indicou uma urgente necessidade atual de que cada Instituto retorne à sua Regra, “pois nela e nas Constituições se encerra um itinerário de seguimento, qualificado por um carisma específico e autenticado pela Igreja.” [30]

60. A força de nossas próprias normas está claramente afirmada na Constituição 74: “As Constituições, Estatutos e os decretos legítimos devem ser observados pelos superiores junto com os confrades, em comunhão de Espírito, como válido instrumento, pelo qual os confrades e as comunidades sempre se conformem à vontade de Deus e cumpram a missão de Cristo, como Ele disse de Si mesmo: ‘Desci do céu, não para fazer minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou’ (Jo 6,38).” Ignorar as Constituições e Estatutos ou relegá-los à periferia da vida de uma província ou da Congregação toda claramente coloca em risco a fidelidade de seus membros.

61. Finalmente, uma mediação específica da vontade de Deus para a Congregação é a voz dos pobres abandonados. Pensamos no decisivo encontro de Afonso com os pastores e cabreiros nas montanhas acima de Scala. O que ele “ouviu” lá levou-o a entender e aceitar a vontade de Deus: que ele deixasse para trás os pobres das vielas de Nápoles e passasse o resto da vida entre o povo abandonado do interior.

62. Como estamos lembrados, sempre que Afonso queria descrever seu Instituto para as autoridades eclesiásticas ou civis, enfatizava como característica essencial o fato de que suas comunidades deviam estar localizadas no meio do pobres abandonados do interior. Este particular distinguia os Redentoristas dos Pii Operai e dos outros grupos missionários que continuavam morando nas cidades enquanto faziam uma ocasional incursão no mundo dos abandonados.

63. A meu ver, Afonso insistia nessa característica não simplesmente por razões pastorais, ou seja, para permitir aos abandonados mais acesso a nossas casas e dar aos missionários mais facilidade para percorrer diferentes dioceses. Conhecendo o papel decisivo que a voz dos pobres abandonados exerceu em seu próprio discernimento, creio que Afonso quis seus companheiros sempre próximos do tipo de pessoas pelas quais o próprio Jesus manifestou uma clara preferência. Assim, a voz delas continuaria a revelar para os Redentoristas a originalidade da sua vocação. Como ele escreveu às comunidades de Scifelli e Frosinone em 1778:

“Atender as almas, mas especialmente os pobres, os camponeses e os mais abandonados. Lembrem-se de que Deus evangelizare pauperibus misit nos nestes nossos dias. Gravem isto firmemente em seus corações e busquem somente a Deus entre os pobres abandonados se quiserem agradar a Jesus Cristo.” [31]

64. Nossas Constituições nos convidam a descobrir o Senhor nas pessoas que nos interpelam de modo especial: os “abandonados” (Const. 3), com especial atenção para com “os pobres, os fracos e os oprimidos” (Const. 4) e uma preferência pelas “condições de necessidade pastoral” (Const. 5). Buscamos a Deus nas circunstâncias concretas da vida, esforçando-nos por “ir ao encontro do Senhor onde Ele já está presente e atua com seu modo misterioso” (Const. 7) e deixando que as circunstâncias específicas de uma determinada situação pastoral nos ensinem o tipo de resposta que devemos dar (Const. 8). O dom do Espírito Santo nos permite reconhecer Deus atuando nas circunstâncias ordinárias da vida (Const. 24) mas especialmente nos “ansiosos questionamentos” dos homens e mulheres de nosso tempo (Const. 19).

65. Em resumo, a obediência é uma atitude fundamental de todo fiel, não a prerrogativa exclusiva de um pequeno grupo de pessoas que a professam como conselho evangélico. Os Redentoristas, como quaisquer outros na Igreja, são chamados a obedecer, seguindo o exemplo de Jesus, que veio não para fazer a Sua vontade, mas a do Pai (Jo 6,38). A diferença é que cada membro da Igreja vive essa obediência a Deus conforme seu carisma e vocação. A vontade de Deus não existe anteriormente à vocação; é pela específica vocação que Deus manifesta Sua vontade ao indivíduo. [32] Assim, pelo nosso voto nos comprometemos a obedecer num estilo redentorista: buscando a vontade de Deus que se revela por Sua Palavra, pelas normas de nosso projeto carismático e pela voz dos pobres abandonados.

III. AGIR

Eis que faço uma coisa nova! Ela já desponta, não a percebeis?
(Is 43,19)

66. Repito a asserção feita antes nesta carta: que a obediência é o voto axial para os Redentoristas num tempo de mudança. No passado, este voto foi considerado principalmente em termos pessoais e legalistas. Embora as nossas Constituições ainda entendam o voto como obrigando os confrades a obedecer às legítimas ordens dos superiores (Const. 71), há uma necessidade urgente de considerar este voto como um apelo a criar “comunidades obedientes” em todo nível da Congregação. Os votos são sempre dos indivíduos e da comunidade. Seria um sério erro separar essas duas dimensões e reduzi-los simplesmente a obrigações individuais.

67. Sem uma comunidade comprometida a buscar de maneira obediente a vontade de Deus, é difícil, se não impossível, para os indivíduos permanecer obedientes. É claro que nenhum de nós pode viver plenamente e com alegria a liberdade do voto de obediência sem a força de uma comunidade obediente, já que a obediência de cada indivíduo ao Pai tem lugar dentro da estrutura da comunidade eclesial. Não é só a relação fundamental e pessoal entre a consciência da pessoa e Deus que é significativa; a relação com nossos irmãos é igualmente importante. De fato, a vitalidade de uma comunidade está intimamente ligada à qualidade de sua obediência como comunidade. [33]

68. Como podemos assegurar que nossas comunidades – locais, provinciais ou a própria Congregação, [34] permaneçam obedientes? Creio que precisamos distinguir entre as muitas vozes que procuram colonizar nosso espírito, intensificando a nossa atenção à Palavra de Deus, ao projeto carismático da Congregação e à voz dos pobres abandonados.

Lâmpada para nossos pés … Luz para nosso caminho

69. A Palavra de Deus é a fonte da nossa vocação, nosso sustento diário e o conteúdo de nossa obra missionária. Precisamos proclamar, meditar, partilhar e rezar em obediência à Palavra e esforçar-nos por fazer da Palavra o nosso “primeiro livro de espiritualidade” [35] . Devido ao papel absolutamente vital que a Palavra exerce para os discípulos, a Congregação deve dar maior valor à escuta, que não é, primeiramente e sobretudo, uma técnica de dinâmica de grupo mas uma busca contínua do que o Pai quer.

70. Como judeu piedoso, Jesus devia começar sua oração diária repetindo as palavras do Deuteronômio: “Ouve, ó Israel! O Senhor é nosso Deus, o Senhor somente! Portanto, amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, com toda a tua alma e com todas as tuas forças” (Dt 6,4-5). Diz ele a seus discípulos: “Todo aquele que é de Deus ouve as palavras de Deus” (Jo 8,47). Como podem as nossas comunidades demonstrar esta atenção diária à Palavra de Deus?

71. O ritmo da vida comunitária deve ajudar os membros a ouvir atentamente a Palavra. A leitura diária e períodos de meditação em comum nos ajudarão a ouvir a palavra enquanto comunidade e a pedir a luz do Espírito Santo para compreendê-la. Muitas comunidades locais têm toda semana um tempo de partilha em preparação da homilia dominical ou outros momentos de proclamação extraordinária. Devemos encorajar-nos mutuamente a deixar que a Palavra de Deus transforme nossos corações e dar maior valor à recepção do Sacramento da Reconciliação e à direção espiritual.

72. Se concordamos com São Jerônimo em que “ignorar as Escrituras é ignorar Jesus Cristo,” [36] então a dificuldade em descobrir a dimensão profética da nossa vocação pode estar enraizada na falta de familiaridade com a Palavra de Deus. Afinal, Jesus comissiona seus apóstolos dizendo: “Sereis minhas testemunhas” (At 1,8); é a ele e a seu Reino que damos testemunho. São João Crisóstomo observa que os apóstolos desceram do monte na Galiléia, onde haviam encontrado o Senhor ressuscitado, sem tábuas de pedra escritas como as que Moisés recebera: as vidas deles se tornariam evangelho vivo, daquela hora em diante. [37]

No coração da comunidade… está o próprio Redentor e seu Espírito de Amor

73. Parece-me que precisamos aceitar que não é arbitrário seguirmos a Cristo de um modo ou de outro. Em matéria de vocação não existe nada arbitrário. Cada cristão deve procurar sua vocação, ou seja, a vontade de Deus no seu caso individual e, uma vez encontrada, como o negociante da parábola de Jesus, “se alegra e vende tudo o que tem” para viver na fidelidade ao chamado do Senhor (Mt 13,44). Para papai e mamãe, a vocação deles como esposos e pais é superior a todas as outras porque é a vocação deles, isto é, aquela à qual foram chamados. Para mim, ser Redentorista é o modo melhor de viver porque é aquele ao qual Deus me convidou.

74. Pela nossa profissão, respondemos ao Senhor com o dom total de nós mesmos e nos comprometemos a buscar a vontade de Deus dentro de uma comunidade eclesial concreta, a Congregação. A nossa obediência a Deus, algo invisível, tem lugar dentro da estrutura de nossa comunidade visível.

75. Assim como não podemos afirmar que amamos a Deus que não vemos, se desprezamos o irmão que vemos (cf. 1Jo 4,20-21), os Redentoristas não podem afirmar que estão buscando a vontade de Deus, a não ser que esta busca tenha lugar dentro da comunidade visível da Congregação. Assim, as normas para guiar o discernimento e a tomada de decisões são de crucial importância para evitar o perigo de reduzir a missão da Congregação a um ofício ou uma carreira que é abraçada principalmente para a sua própria vantagem e então é administrada mais ou menos pelo próprio indivíduo. [38] As nossas Constituições propõem que a busca da vontade de Deus é uma tarefa pela qual cada membro da Congregação é corresponsável.

76. Nenhum Redentorista pode eximir-se de ajudar a criar uma comunidade obediente, já que a cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum (Const. 92; cf. 1Cor. 12,7; Const. 72). Por isso, um serviço crucial para os que exercem autoridade é encorajar a comunidade em seu esforço de escutar, discernir e executar a vontade de Deus, “levando os confrades a cooperar com obediência ativa e responsável no desempenhar encargos e no assumir iniciativas.” (Const. 72).

77. Um instrumento importante no exercício da obediência corresponsável é o diálogo, designado por Paulo VI como um novo nome da caridade [39] e para o qual a vida consagrada deve oferecer uma experiência privilegiada. [40] Ainda que o discernimento comunitário não seja um substituto para o serviço da autoridade na comunidade, os que exercem autoridade devem sempre ter em mente que a comunidade é o melhor lugar no qual reconhecer e aceitar a vontade de Deus. [41]

78. As nossas Constituições e Estatutos, bem como os decretos dos recentes Capítulos Gerais, propõem alguns modos pelos quais a comunidade busca a vontade de Deus. As assembléias e capítulos provinciais são momentos privilegiados para ouvir, discernir a vontade de Deus e dar uma resposta efetiva. Todos os membros da (Vice-)Província devem ter oportunidade de contribuir generosamente para a reflexão do Capítulo, ou pela participação num processo de preparação bem articulado, ou como membros eleitos. Para este fim, os membros da Unidade devem ser bem informados sobre as questões que serão examinadas pelo Capítulo e ter oportunidade de expressar sua opinião.

79. O princípio da corresponsabilidade não significa que cada um deve estar fisicamente presente no Capítulo. Com efeito, o Conselho Geral tem sérios questionamentos sobre a eficácia de grandes Capítulos, especialmente como expressão ordinária de governo em Unidades maiores. Entre os muitos problemas desta forma de governo, temos visto que esses organismos produzem determinações que são muitas vezes tão vagas e expressas numa linguagem tão genérica, que o governo provincial recebe pouca orientação eficaz para o exercício de seu mandato. A falta de uma clara direção para uma Província é um convite a todo tipo de exagerado individualismo que prejudica certo número de Unidades hoje em dia. Faltando um discernimento obediente e colegial de suas prioridades, os membros da Unidade são encorajados a “buscar alguma coisa para fazer”, acelerando assim a fragmentação da comunidade.

80. Em nossa Congregação, as eleições não são simplesmente uma questão de depositar votos e contá-los; muito menos a procura de alguém que não vai incomodar os confrades na realização de seus projetos individuais. Ao invés, as eleições devem ser um importante exercício do voto de obediência da parte da comunidade provincial, que é caracterizado por uma humilde e corresponsável busca da vontade de Deus. Já que o processo eleitoral deve ser realizado numa atmosfera orante, esperando-se que conduza a uma convergência de vistas, a Congregação deve examinar com visão crítica certos processos, mais ou menos democráticos ainda que privatizados, tais como votar pelo correio. É difícil ver como esse sistema favorece o diálogo e o discernimento entre os confrades da Unidade. A finalidade apostólica da Congregação deve penetrar e inspirar o discernimento e a seleção dos líderes.

81. O XXII Capítulo Geral (1997) recomendou à Congregação o uso do projeto de vida comunitária. Algumas Províncias fazem uso regular desse instrumento e nele têm encontrado um meio poderoso para a busca da vontade de Deus na situação concreta da comunidade local. A preparação do plano provoca um frutuoso diálogo que visa inserir os dons pessoais de cada confrade num projeto comum. Uma avaliação periódica do projeto pode ocasionar uma proveitosa revisão de vida pelos membros e abrir a porta para a conversão contínua.

82. Finalmente, dada a função particular do superior local no discernimento da comunidade (cf. por exemplo Const. 72, 136; Est. geral 037), uma importante estrutura para promover a corresponsabilidade são as reuniões periódicas dos superiores, destinadas à sua formação contínua naquilo que deles se espera conforme o projeto carismático da Congregação.

O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me consagrou com a unção …

83. Junto com a obediência à Palavra de Deus e a adesão às Constituições e Estatutos, a nossa atenção obediente à voz dos pobres abandonados ajuda-nos a garantir nossa fidelidade à vontade de Deus. Nesses anos tenho meditado muitas vezes sobre o encontro do diácono Filipe com o oficial de Candace, rainha da Etiópia, narrado nos Atos dos Apóstolos (At 8,27ss). Enquanto voltava de Jerusalém, o eunuco fazia uma leitura atenta do Livro do Profeta Isaías. Porém, por mais que se esforçasse, simplesmente não conseguia entender o texto. Quando Filipe entrou em seu carro e explicou-lhe a Palavra, o oficial não apenas entendeu mas foi convertido para o Senhor. Sua vida tomou uma nova direção e ele pediu para ser batizado.

84. Há uma lição para nós nesta passagem dos Atos? Nós Redentoristas temos uma “página” à nossa frente, seja ela a própria Palavra de Deus, seja o momento presente da história, e, não obstante nossos esforços, não conseguimos “lê-la” – seu sentido nos escapa. Assim como o Espírito conduziu Filipe para ajudar o eunuco a entender o que ele estava lendo, assim o Espírito deu à Congregação os pobres abandonados como nossos tutores. Se não ouvirmos sua voz, a página escrita da Escritura, as Constituições e Estatutos e o mundo ao nosso redor permanecerá amplamente indecifrável para nós.

85. Nós ouvimos os pobres abandonados, primeiramente e sobretudo, por causa de Jesus Cristo, que iniciou seu ministério público com uma proclamação de esperança para os pobres, os fracos e os oprimidos da terra: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pois me consagrou com a unção para anunciar a boa-nova aos pobres. Enviou-me a proclamar aos cativos a libertação e aos cegos a recuperação da vista, para pôr em liberdade os oprimidos e proclamar um ano de graça do Senhor” (Lc 4,18-19). Afonso ligou a missão da Congregação com a missão de Jesus Cristo e usou essa passagem de Lucas para nos ajudar a entender por que existimos na Igreja.

86. Não estamos apresentando às pessoas um Deus distante e difidente, mas, antes, ajudamos as pessoas a ver que Deus deu o primeiro passo e já está entre elas. Escutamos os pobres abandonados a fim de descobrir o Senhor “onde já está presente e atua com seu modo misterioso” (Const. 7) especialmente entre os marginalizados pela Igreja ou pela sociedade. Deus nos confiou a missão de testemunhar Sua própria kenosis que o leva às profundezas de nosso mundo e de volta ao céu, de contar essa história a outros que de outra forma teriam pouca chance de ouvi-la e oferecer-lhes plena participação na vida divina.

87. Escutar a voz dos pobres abandonados não apenas nos convence de seu apelo a nós; percebemos também que eles oferecem seus próprios dons à Congregação. Por meio deles, experimentamos o mistério da força de Deus que se manifesta na fraqueza (2Cor 4,7-9), não só entre as pessoas que servimos mas também na fragilidade de nossos próprios recursos. Os pobres nos ensinam que a força se encontra na comunidade e no relacionamento, e assim nos encorajam a procurar novas estruturas de cooperação que vão sustentar nossa obra missionária. Finalmente, os pobres abandonados nos convidam a uma missão que é sempre uma resposta gratuita ao amor abundante de Deus: “De graça recebestes; de graça deveis dar” (Mt 10,8). É nossa própria experiência da gratuita compaixão de Deus que nos impele a fazer o dom total de nós mesmos.

88. Os pobres não precisam de nós. Se escolhermos não ir até eles, Deus vai encontrar outras pessoas, já que ele ouve o clamor dos pobres. Meus irmãos, a questão é que nós precisamos dos pobres, se quisermos ser fiéis à missão que nos foi confiada. A obediência à voz deles não é simplesmente “fazer coisas” por eles, mas entrar num processo de conversão que nos leve a esvaziar-nos de nós mesmos e oferecer nossas vidas como um dom. Para tanto, devemos reconhecer que os pobres abandonados realmente existem: eles não são simplesmente teorias ou estatísticas, mas têm nomes e rostos. Nós vamos aonde a Igreja não pode ou não quer ir, e escutamos as pessoas que lá encontramos. Se ouvirmos sua voz, junto com a Palavra de Deus e nossas Constituições e Estatutos, vamos aprender o que nos cabe fazer.

CONCLUSÃO

Maria, porém, disse ao anjo: "Como será isto, se eu não vivo com um homem?"… Respondeu Maria: "Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra." (Lc 1,34.38)

89. O Congresso Internacional sobre a Vida Consagrada, um evento sem precedentes que reuniu em 2004 mais de 800 participantes – a maioria Superiores Gerais de Congregações masculinas e femininas, junto com presidentes de praticamente todas as Conferências nacionais de religiosos e certo número de teólogos – produziu um Documento Final com certos pronunciamentos audaciosos. Entre os mais fascinantes está este:

“De uns tempos para cá algo novo tem surgido entre nós além de outras realidades de morte (tradições e estilos obsoletos, instituições que morrem). A agonia do que está morrendo e a confiança no que está nascendo nos afetam. Embora não vejamos ainda claramente o que o Espírito está fazendo nascer na vida consagrada, no entanto identificamos … novidades que brotam …” [42]

90. Após dezoito anos de escuta dos Redentoristas e dos irmãos e irmãs que nos acompanham, como também dos membros de outros institutos de vida consagrada, estou mais convencido do que nunca de que algo novo está nascendo em nossa Congregação. O nosso exercício do voto de obediência nos ajudará a vislumbrar o que o Espírito está fazendo surgir e nos dará corações que sejam bastante livres para fazermos nossa parte na grande obra da Redenção.

91. Devemos ser como Maria na anunciação: ela pergunta (Lc 1,34), reflete, medita. Ela confia e se abandona a Deus. Sua obediência é “crer mas interrogar;” [43] ao mesmo tempo, “pronta na obediência”. [44] Ela “conservava todas estas coisas e as meditava em seu coração” (Lc 2,19), “encontrando assim o laço profundo que unia eventos, gestos e coisas aparentemente distintos no grande plano divino.” [45] Nela reconhecemos nossa Mãe, solícita para nos ajudar a cada instante, mas também nosso modelo nos caminhos da fé. [46] Que ela nos ajude a escutar o Senhor e a reconhecer a grandeza da nossa vocação. Que ela nos leve a um amor sempre mais profundo para com seu Filho, o Redentor do mundo.

Fraternalmente no Cristo Redentor,

Joseph W. Tobin, C.Ss.R.

Superior Geral

A língua original deste documento é o inglês.
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[1] João Paulo II, Exortação Apostólica Vita Consecrata, (25 de março de 1996) 24.
[2] Cf. Vaticano II, Decreto Perfectae Caritatis, n. 2.
[3] Acta Integra Capituli Geralis XX, Roma 1985, 217.
[4] Acta Integra Capituli Geralis XXI, Tipografia Poliglota dlla Pontifícia Universidade Gregoriana, Roma 1992, 313.
[5] Ibid, 339-340.
[6] Cf. Félix Catalá, C.Ss.R., “Dimensões da Espiritualidade Redentorista”, publicado em www.redemptoristspirituality.net.
[7] David Couturier, OFM Cap., “Religious Life at a Crossroads”, em Origins 36, n. 12 (2006) 181-188.
[8] Cf. Catalá, op. cit.
[9] Acta Integra Capituli Geralis XXI, p. 327.
[10] Paulo VI, Exortação Apostólica Evangelica Testificatio (29 de junho de 1971), n. 7.
[11] Congresso Internacional sobre a Vida Consagrada, Documento Final O que o Espírito está dizendo à Vida Consagrada? (Roma: Novembro de 2004), n. 2.
[12] Ibid.
[13] Paulo VI, Discorsi al Popolo di Dio 1966-1967 (Roma 1968), 119.
[14] Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, Instrução O Serviço da Autoridade e a Obediência: Faciem tuam, Domine, requiram (Cidade do Vaticano: 2008), 4; daqui em diante, Instrução.
[15] Cf. José Rovira, CMF, Autorità-Obbedienza e la Ricerca della Volontà di Dio, Conferência pronunciada na 71a Assembléia da União dos Superiores Gerais (29 de maio de 2008).
[16] O Serviço da Autoridade, 3b.
[17] O Serviço da Autoridade, 23a.
[18] Santo Afonso de Ligório, Uniformità alla volontà di Dio, Città Nuova, Roma 1999, 55.
[19] Rovira, op cit., 4.
[20] Ibid., 4.
[21] Uniformità alla volontà di Dio, p. 76.
[22] Santo Agostinho, Sermo 328, 8.
[23] O Serviço da Autoridade, 7
[24] Bento XVI, Encíclica Spe Salvi (2007), 43.
[25] O Serviço da Autoridade, 7.
[26] Cf. Constituições e Estatutos C.Ss.R., 74; Perfectae Caritatis, n. 2a.
[27] Vaticano II, Constituição Dei Verbum, 10.
[28] Catecismo da Igreja Católica, nn. 85-86.
[29] O Serviço da Autoridade, 9.
[30] Vita Consecrata, 37.
[31] Cf. Antonio M. Tannoia, Della vita ed Istituto del Venerabile Servo di Dio Alfonso M. Liguori, Vescovo di S. Agata de’ Goti e Fondatore della Congregazione de’ preti missionari del SS. Redentore, 4 vol., Napoli 1798-1802, vol. IV, cap. 9,44.
[32] Cf. Rovira, op. cit., p. 8.
[33] Sabatino Maiorano, C.Ss.R., “Autorità e vita fraterna: dialogo, discernimento ed obbedienza”, em Il Servizio dell’Autorità e l’Obbedienza, Roma 2009, 88.
[34] A Constituição 21 nos recorda que o termo “comunidade” pode designar toda a Congregação, a (vice-)província, ou uma comunidade local ou pessoal.
[35] Vita Consecrata, n. 94.
[36] São Jerônimo, Comentário a Isaías (nn. 1.2: CCL 73, 1-3).
[37] Citado em Bento XVI, Mensagem ao Povo de Deus da XII Assembléia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos (2008), 10.
[38] Cf. O Serviço da Autoridade, 23.
[39] Paulo VI, Encíclica Ecclesiam Suam (1964), n. 64.
[40] Vita Consecrata, 74.
[41] O Serviço da Autoridade, 20e.
[42] O que o Espírito está dizendo à Vida Consagrada?, n. 2.
[43] O Serviço da Autoridade, 31a.
[44] Vita Consecrata, 112c.
[45] Mensagem ao Povo de Deus, 9.
[46] Vaticano II, Constituição Lumen Gentium, 65.
Créditos: Site da Congregação Redentorista

Um comentário:

  1. Bastante interessante o conteúdo dessa carta pastoral redentorista....

    Chamaram-me à atenção os ítens 17 e 18 onde o Padre Geral refere-se aos Missionários Leigos,tendo em vista que após o último ENESER, fez-se uma bonita referência na busca do ideal do ex-seminarista que não se tornou sacerdote : LEIGO, MISSIONÁRIO, REDENTORISTA, SANTO!

    O ítem 32 recorda o artigo 54 da constituição "que é a profissão religiosa (e não a ordenação) o ato que define toda a vida missionária dos Redentoristas."
    Muito bom para refletir-se sobre o envolvimento dos religiosos na vida profana...

    E, a partir do ítem 37, o Pe.Joseph W. Tobin, C.Ss.R. faz um tratado completo sobre o voto crucial, segundo ele, a OBEDIÊNCIA....

    A carta do Superior Geral Redentorista é muito interessante e nos leva, ainda que leigos, a refletir sobre a vida da CONGREGAÇÃO DO SANTÍSSIMO REDENTOR, fundada por Santo Afonso!

    LEIAM TODOS!

    Antônio Ierárdi Neto

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